Dia
30 de Novembro de 1955, Isadora Scarlet, esposa de Duran Scarlet, que
estava grávida, entrou em trabalho de parto. O marido chamou a
parteira e esta ajudou sua esposa. Algumas horas depois, Isadora
finalmente deu a luz a uma menina. O Sr. Scarlet foi verificar como
estava a esposa e também a sua filha:
–Querida,
tudo bem? Você deve estar cansada.
–Só
um pouco.
–Sr.
e Sra. Scarlet, aqui está a criança. - disse a parteira, depois de
limpar o bebê
–Ela
é linda, Isadora. Se parece com você!
–Ah,
querido, ela tem os seus olhos.
–Qual
será o nome dela? - perguntou a parteira
–Amélia.
- se pronunciou – Amélia Scarlet.
Assim,
a vida da menina começou.
Passados
alguns anos, Isadora adoeceu e faleceu. Duran passou a cuidar da
filha sozinho desde então. Acabou mimando-a para tentar suprir a
falta da esposa.
Amélia
crescia se mostrando uma menina inteligente e independente.
Parecia-se mais com a mãe a cada dia que passava.
Numa
noite, a menina brincava em seu quarto, sozinha, como sempre. O pai
apareceu e tinha uma outra pessoa com ela.
–Filha,
há uma pessoa que eu quero lhe apresentar. Este é meu amigo: Cinna
Hildrum. Cinna, esta é minha filha: Amélia.
–É
um prazer, senhor.
–O
prazer é todo meu, senhorita.
Cinna
aparentava ser de meia idade, talvez até um pouco mais velho que seu
pai. Porém, a garota notou que tinha alguma coisa estranha nele. A
cor de sua pele era a mais pálida que já vira e os olhos dele.
Tinha algo místico naqueles olhos. Cinna não era uma pessoa normal,
ela tinha certeza disso.
Não
comentou nada com ninguém, achou que fosse só coisa da cabeça
dela.
Os
anos foram passando e a jovem crescia. Continuou os estudos e no ano
em que se formaria, seu pai adoeceu.
Duran
Scarlet pirou de repente, sem qualquer explicação lógica.
Definhava cada vez mais. Os médicos tiraram quaisquer esperanças de
melhora para ele.
Quando
Cinna soube da situação foi imediatamente a mansão dos Scarlet
para ver o amigo.
–Cinna!
- disse Duran, sofrendo
–Duran,
meu amigo. Assim que o soube o que está acontecendo, vim o mais
rápido que pude.
–Eu
não tenho muito tempo de vida restando.
–Não
diga isso. Você sabe bem que eu posso resolver essa situação.
Basta aceitar “O abraço”.
–Eu
já lhe disse que não quero. É uma maneira egoísta de me livrar
disto.
–Egoísta
como? Vai deixar a sua filha sozinha? Ela já não tem mãe e também
ficará sem pai.
–Ela
tem que entender que eu não durarei para sempre, nem ela mesma
durara para sempre.
–Não
ensinou nada a ela sobre o legado de sua família. Quem vai cuidar da
sua empresa?
–Eu
tenho empregados para isso. Minha filha tem é arrumar um bom partido
e se casar.
–Duran,
estamos na década de 70. As mulheres não são mais apenas donas de
casa. E pelas cartas que me manda, Amélia merece e consegue algo bem
melhor do que isso.
–E
o que uma mulher poderia fazer?
–Bastante
coisa! Já vi muita coisa nessa minha eternidade que você jamais
entenderia. Eu já presenciei, inclusive, mulheres lutando em
guerras.
–Prometa
uma coisa para mim, Cinna!
–Pode
dizer.
–Que
você cuidará da Amélia por mim.
–Claro.
Eu prometo!
–Chame
a minha filha aqui! - ordenou Duran a um empregado
Passados
alguns minutos, ela chega, cumprimenta Cinna e depois se dirige ao
pai.
–Papai!
Me chamaram urgente. O que houve?
–Filha,
eu não tenho muito tempo. Eu preciso te falar uma coisa.
–É
sobre o que você tem? Algum médico disse alguma coisa?
–Sim
e não. Essa doença que eu tenho é um “mal de família”. Meu
avó morreu disso e meu pai também. O mesmo acontecera com você.
Ainda não descobriu-se a causa, só sei que os órgãos começam a
falham e morremos em questão de dias. Não posso afirmar quando isto
acontecerá com você, mas vai. E tem que estar preparada.
–E
ninguém pode te ajudar?
–Na
verdade, a única pessoa que poderia está bem do seu lado. Só que,
eu não quero a ajuda dele.
–E
o que será de mim sem você, papai? Já perdi a mamãe e agora você.
- começou a chorar
–Cinna
cuidará de você. Ajudará no que precisar. - tomou fôlego –
Termine seus estudos, arrume um marido e seja feliz, filha. Eu te
amo!
Duran
Scarlet fez um último carinho no rosto da filha antes de morrer. A
garota ficou inconsolável, chorou alguns minutos debruçada sob a
cama. No enterro de seu pai, ela recebeu muitos abraços e consolos
de outros parentes e de amigos.
Cinna
mudou-se para a mansão Scarlet e passou a cumprir sua promessa,
porém Amélia não estava se cuidando muito bem. Ela entrou em
depressão.
Todos
os seus dias eram de grande sofrimento. Era horrível acordar todos
os dias e ter que ir ao colégio. Sua sorte era que aquilo acabaria.
As
poucas amigas que ela tinha até tentavam animá-la, contudo não
adiantava.
Amélia
passava seus dias lendo bastante e isolada.
Ela
e Cinna quase não conversavam, apenas faziam isso na hora do jantar.
Ou pelo menos, Cinna tentava conversar com ela.
–Então,
Amélia, como o seu dia no colégio?
–Foi
normal. Eu tive as mesmas aulas chatas de matemática.
–Não
se preocupe, logo isso vai acabar. Mas, o que vai querer fazer
depois?
–Ora,
eu não sei. Acho que morrer seria a melhor opção.
–Não
diga isso, você é tão jovem e tem muita coisa para viver ainda.
–Até
definhar de uma causa desconhecida e sem aviso prévio. Ah sim, muita
coisa.
–Todos
nós temos data de validade, aproveite a vida antes dela acabar.
–Aproveitar
o que? Eu só tinha o meu pai, agora não tenho mais nada.
–Claro
que tem! Tem todas essas pessoas que vivem junto de você, inclusive
eu.
–Mas,
não são pessoas com quem eu posso falar o que está preso em mim. -
levantou-se da mesa – Eu já terminei. Com licença!
Esta
foi a maior conversa que já tiveram. Na maioria das vezes, a garota
era monossilábica.
A
jovem também passou a prestar atenção em Cinna. Ela notou que ele
sempre se levantava após o pôr-do-sol. Os novos empregados, que
vieram para a mansão junto com ele, apareciam com marcas de mordidas
estranhas. Ainda tinha o detalhe da palidez e os olhos que ela notara
ainda criança. Antes acreditava fielmente que era só coisa da
cabeça dela, porém estas novas evidências apontavam que não era
apenas uma cisma.
Novamente,
ela não comentou com ninguém. Afinal, não tinha com quem fazer
isso.
Em
seu 18º aniversário, fez uma festa de aniversário somente com as
amigas. Ela conseguiu esquecer um pouco os problemas ao se divertir.
Elas saíram pouco antes de escurecer.
Amélia
ficou admirando os seus presentes, agora meio indiferente. Cinna
apareceu.
–Feliz
aniversário, Amélia! Um pouco atrasado, mas aqui está o seu
presente.
–Ah,
obrigada, Cinna.
A
jovem começou a abrir o embrulho.
–Um
caderno, Cinna? Para que isso?
–É
o “alguém” para você conversar. Um diário. Escreva nele quando
tiver vontade. Acho que você deve ter muito coisa trancada ai
dentro. - terminou apontando para o coração dela
–Obrigada,
Cinna! - ela falou sinceramente abraçando o caderno.
Assim,
mais tempo se passou. A menina se formara no colégio e passou a
ficar apenas na mansão e via as amigas de vez em quando. As únicas
coisas a que se dedicava eram ler e escrever em seu diário. Ela
descobriu o quanto era bom poder colocar aquilo o que estava nela
para fora, mesmo que o diário não fosse lido por ninguém além
dela. Sua depressão melhorou bastante nesse meio tempo, porém não
por completo. Amélia precisava de um sentimento bem mais poderoso
para se livrar da tristeza de ser órfã.
E
ela teria isso em breve.
***
Mais
de um ano se passou. Amélia agora tinha 19 anos e era alguém sem
perspectiva alguma para sua vida. Talvez realmente seguisse o
conselho de seu pai e se casaria.
Era
a data do aniversário de Cinna e ele resolveu fazer uma festa com
alguns convidados. A mansão Scarlet estava bem mais cheia do que o
normal.
Outra
coisa que Amélia aprendeu com a depressão foi a detestar locais
cheios. Aquele barulho e aquela gente toda a estavam irritando. Ela
gostava do silêncio e de que sua mente borbulhasse. Além disso,
todos eles tinham a mesma aparência estranha do aniversariante.
A
garota ficara isolada num canto apenas devaniando, pensando no que
supostamente escreveria no diário mais tarde. E novamente, Cinna
veio apresentar algum conhecido seu para ela.
–Amélia,
este aqui é meu amigo de longa data William. William, esta é a
senhorita Scarlet.
–É
um prazer, senhorita!
A
jovem fez a reverência devida e outra pessoa lhe foi apresentada,
desta vez por William.
–Este
é o Sr. Drake, meu aprendiz.
–Prazer,
senhorita. Pode me chamar me Mark, que é o meu primeiro nome, eu
detesto formalidades.
–Se
é assim, me chame de Amélia. - respondeu com um sorriso
Ela
percebeu algo de diferente em Mark. Ele não tinha a pele pálida e
nem o olhar meio sombrio, só era um rapaz um pouco mais velho que
ela e também muito bonito.
–Vamos
deixar os dois sozinhos, Cinna. Melhor se acostumarem com a companhia
um do outro, afinal, ficaremos por aqui uns dias.
Mark
e Amélia sentaram-se no sofá daquele canto do salão e conversaram.
–Não
fazia ideia de que ficaria alguns dias por aqui.
–Pois
é, meu mestre tem que resolver algumas coisas com o seu.
–Cinna
não é meu mestre, Mark.
–O
que Cinna é então?
–Tutor.
Ele cuida de mim desde que meu pai morreu.
–Órfã?
Eu sou também!
–Perdeu
seus pais muito cedo?
–Na
verdade, nunca os conheci. Desde que me lembro vivi em um orfanato,
então o William me encontrou e começou a me treinar. Eu cuido de
umas coisas para ele.
–Interessante.
Eu não tenho nenhuma habilidade impressionante que nem você, sou só
uma jovem rica e mimada.
–Eu
não vejo só isso. Tenho certeza de que sabe fazer algo.
–Se
ler for esse “algo” que você diz.
–Ler
é bom! Pena que eu não tenho tempo para tal. Quantos já leste?
–Talvez
uns duzentos, eu não conto esse tipo de coisa.
–E
o que você lê exatamente?
–Depende.
Romances, científicos, poesia.
–Quem
sabe você não me fale um pouco sobre eles durante estes dias em que
estarei aqui. Teremos bastante tempo para conversar na ausência do
meu mestre e do seu tutor.
–Sim!
Eles tem esses hábitos noturnos que eu não entendo.
–Um
dia entenderemos, sem dúvida.
E
a conversa deles continuou, se conheceram um pouco mais naquela
noite. Foram dormir antes do resto dos convidados, afinal, eles ainda
eram humanos.
No
dia seguinte, encontraram-se para comer a mesa.
–Tem
muito tempo que eu não tenho companhia no café da manhã.
–Isso
é uma coisa boa, não é?
–É
sim!
–Pelo
que parece você passa o dia todo sozinha não é?
–Isso
mesmo, só vejo o Cinna a noite. E os empregados estão sempre muito
ocupados para conversarem comigo.
–Isso
justifica os seus mais de duzentos livros lidos. É só isso o que
você faz o dia todo aqui?
–Não!
Coordeno a casa na ausência do Cinna e eu escrevo também.
–Escreve?
–É
só um diário! A única “pessoa” que me dá ouvidos nessa
mansão.
–Deve
ser bem pessoal, talvez não deixe eu ler.
–Quem
sabe... - ela fez uma careta
–Quer
ir um pouco lá fora quando terminarmos de comer?
–Claro!
Acabaram
de comer e fizeram o que combinaram.
–Não
me lembrava que este jardim era tão bonito. - comentou Amélia –
Venho pouco aqui!
–Deveria
vir mais. É um ótimo lugar para se inspirar quando se vai escrever.
–Eu
não sou escritora, Mark.
–Mas
tem “cara de”. Por que não tenta escrever um livro?
–Sobre
o quê? Eu não vivi muita coisa.
–Sei
lá. Qualquer coisa. Deixe acontecer.
–Vou
pensar melhor sobre isso.
–Faça
isso mesmo. - falou sorrindo
Amélia
olhou para o céu limpo daquela manhã e disse:
–O
que nós faremos até anoitecer e eles acordarem?
–Podemos
fazer qualquer coisa. - respondeu com um olhar malicioso
–O
que está insinuando em? - deu um tapa de leve no ombro dele – Não
sou dessas coisas.
–Pensou
exatamente do jeito que eu previ.
–Como
é que é?
–Isso
mesmo. Quer dizer que se interessou por mim.
–Como
pode ser tão descarado?! - gritou, ficando vermelha
–Eu
sou sincero, o que é algo bem diferente. - aproximou-se do rosto
dela – E eu estou da mesma forma por você.
–Não
vamos precipitar as coisas então. - ela admitiu
–Concordo!
–Vamos
lá para a biblioteca. Vou indicar um livro para você ler.
Eles
passaram o resto da manhã na biblioteca, que foi tempo suficiente
para Mark ler o livro que lhe foi indicado. Após o almoço, ele
acabou lendo mais um.
–Até
que você lê rápido.
–Eu
tenho minhas habilidades. - ele olhou o livro que ela lia –
Enquanto o seu ainda nem acabou.
–Esse
é mais difícil. Também não gosto de ler depressa, prefiro
desfrutar da história ao máximo.
Um
empregado entrou no recinto e avisou que Cinna e William acordaram e
esperavam os dois para o jantar. Os dois jovens se dirigiram para o
salão de jantar e os dois vampiros os esperavam.
–Ora,
Mark, Amélia, como foi o dia de vocês?
–Muito
bem! Nos divertimos e conversamos bastante.
–Os
empregados disseram que passaram maior parte do dia na biblioteca
lendo. - soltou William – Como conversaram assim?
–Eles
só contaram o que viram. - respondeu Mark
–Amélia
está com um sorriso que eu nunca vi antes. É bom te ver assim!
–Obrigada,
Cinna!
Jantaram.
O resto da noite se passou com os quatro se divertindo com jogos de
adivinhação. Mark era expressivamente bem melhor nesse tipo de
coisa.
O
relógio indicou que era hora dos mais novos dormirem. Eles subiram
juntos. Mark despedira-se de Amélia na porta do quarto dela.
–Nos
vemos amanhã. - e lhe deu um beijo na testa – Boa noite!
–Boa
noite! - ela respondeu sorrindo
Pela
primeira vez em sua vida, Amélia sentiu seu coração acelerar. E
estranhamente, ela gostava daquela sensação. Não conseguia se
conter de ter que esperar até o dia seguinte.
E
os dias foram se passando e aqueles dois se conheciam cada vez mais e
o encanto que tinham um pelo outro aumentava. Amélia contava todas
as histórias dos livros que lia, enquanto Mark contava alguns dos
trabalhos que realizou para o seu mestre.
Era
o último dia dos dois juntos, muitos sentimentos tinham se
construído e nada havia acontecido entre eles. Amélia finalmente
teve coragem e mostrou para ele o seu diário, onde habitavam os seus
pensamentos e sentimentos mais secretos.
Foram
ao quarto da garota e ela lhe deu o diário, muito receosa ainda, mas
entregou a ele mesmo assim, já estava na hora de alguém ler aquilo.
Ela
ficou sentada na cama lendo outro livro enquanto ele devorava o
diário. Quando finalmente leu tudo, inclusive anotações onde ela
falava o que pensava dele, fechou o caderno, se dirigiu a ela e
falou:
–Eu
disse que você tinha cara de escritora. Gostei de ler o seu diário
e compreendo que deve ter sido difícil me dar esse voto de confiança
e me deixar ler, afinal, é um diário não é?
–Obrigada!
- ela não tinha onde esconder o rosto
–Ainda
mais o que disse sobre mim.
–Acho
que você está fazendo minha depressão ir embora. É o meu
agradecimento por isso!
–Ler
o diário ou ter se apaixonado por mim?
–As
duas coisas. - abaixou o olhar, não conseguia encará-lo
Ele
pegou o queixo dela com uma das mãos e beijou-a. Um beijo que
demorou dias para acontecer e que eles esperaram ansiosamente. O
beijo foi tão intenso que eles acabaram deitados na cama. Os lábios
se separaram. Ele colocou uma mecha do cabelo dela atrás da orelha.
A garota falou:
–Posso
te pedir outra coisa?
–O
que, Amélia?
–Tire
a minha virgindade. Eu quero que seja com você.
–Se
esse é o seu desejo, eu atenderei.
–E
não tenha pressa, nós temos tempo suficiente. E... a porta está
trancada.
Beijaram-se
de novo e mais uma vez e mais outra. Todos aqueles beijos resultaram
nas roupas arrancadas, os dois nus na cama, prontos para o ato.
Mark
penetrou bem devagar e Amélia gemia por conta da dor. Ela se agarrou
nas costas dele e arfava, até que seu hímem se rompeu. Primeiro
fora a dor, depois o prazer.
O
garoto fez movimentos de vai e vem, suavemente, seguindo pelo baixos
sons emitidos por ela. Ele foi aumentando a velocidade entre um beijo
e outro. Demorou alguns minutos até que ele finalmente gozou.
Porém,
nenhum deles ficou satisfeito só com aquela vez. Na sequência
dessa, fizeram mais umas três.
E
ficaram abraçados na cama se recuperando do esforço. Depois de
tantos dias, eles não tinham mais o que conversar. As respirações
descompassadas e os toques foram as suas conversas naquele momento.
–Eu
espero não ter te machucado. - Mark comentou
–Estou
bem. Sério!
–Se
eu pudesse não iria embora amanhã, ficaria aqui com você. Mas eu
tenho um outro trabalho.
–E
se eu pudesse iria com você. - ela sorriu – Mas o Cinna me
trancafia nessa mansão. Pelo menos foi bom passar estes dias com
você.
E
não falaram mais nada. Apenas adormeceram após o ato. Prometeram um
ao outro não contar o que ocorreu naquela tarde a ninguém.
Na
mesma noite, Mark e Wiliam foram embora. Os velhos amigos se
despediram e os dois jovens também.
–Espero
que nos encontremos de novo, Mark.
–Eu
também, Amélia.
Foi
um abraço com um tom de beijo que eles não poderiam dar na frente
de seus mentores.
Eles
até se veriam de novo, mas só dali há muitos anos e nem estariam
do mesmo jeito.
***
Meses
se passaram. O amor que Amélia descobriu sentir por Mark a deu um
outro ar na vida. E ela seguiu o conselho do rapaz: escreveu um
livro. Era sobre aqueles dias que passou com ele. Relembrou de tudo
aquilo em pouco mais de um mês. Porém, tinha vergonha de mostrar
seus manuscritos, guardou-os e começou outra coisa.
Numa
semana ocorreu uma virada brusca no tempo e a garota adoeceu de
repente, começando a definhar na cama assim como aconteceu com seu
pai.
Cinna
a visitava todas as noites e via que a cada dia mais ela piorava.
Chamaram médicos para examiná-la, porém nenhum obteve sucesso.
Cinna sabia bem a causa: a tal “doença de família” dos Scarlet.
Ele
sofria vendo aquela menina, tão jovem, com tanta coisa para viver
ainda, morrer lentamente dessa forma. Ele tinha uma solução para
aquilo.
Conversou
com o seu clã, a Camarilla, e disse que a garota tinha um grande
potencial no futuro e lhe concederam o direito de transformar a
garota. Só havia um problema: Será que ela iria querer?
Passava
da meia-noite e era a data do 20º aniversário de Amélia. Cinna foi
ao quarto:
–Amélia,
feliz aniversário! Vim aqui para falar uma coisa séria com você.
–Obrigada,
Cinna. Não dá para comemorar meu aniversário assim. É a mesma
coisa que meu pai teve não é?
–Segundo
o que eu suponho: Sim. E vim aqui te oferecer uma solução para
isso.
–E
o que seria? - ela se lembrou – Aquilo que ofereceu ao meu pai?
–Exatamente.
Só te explicarei algumas coisas antes. - ele se ajeitou ao lado dela
na cama, sentando na ponta – Você já deve saber, mas eu sou um
vampiro tem mais de 300 anos.
–Por
isso os hábitos noturnos e os empregados com mordidas estranhas por
aí. Realmente pensei que fosse isso. - ela sorriu, um bocado fraca
–Então,
eu falei com meu clã: Camarilla. Eu menti um pouco acerca do seu
potencial para ajudá-los, mas não é nada que eu não possa
resolver te treinando.
–Ajudar
no que?
–Na
nossa eterna luta contra os sabás. Os vampiros mais descontrolados
que existem. Não medem esforços para causar o caos. - respirou
fundo – Deixe eu ir direto ao assunto: Você quer se livrar desse
problema que é a sua doença de família? Virar uma vampira e viver
por toda a eternidade? Ia dizer que veria quem você mais ama morrer,
mas isso já aconteceu a você. No caso, poderá manter o legado de
sua família. Então, aceita “o abraço”?
–Aceito,
Cinna!
–Certo.
Faça o que eu disser, isso doerá um pouco.
Cinna
colocou os seus caninos grandes para fora e mordeu, sem hesitar, o
pescoço de Amélia. Ela deu um grito pela dor. O vampiro começara a
conversão da garota. Sugou praticamente todo o sangue dela,
deixando-a em um estado mais enfraquecido do que já estava, contudo
era um mal necessário.
Amélia
sentiu suas poucas forças se esvaindo. Seus olhos estavam cada vez
mais pesados e ela se esforçava para não desmaiar. Sentia-se
morrendo.
Cinna
soltou o pescoço da jovem e cortou o próprio pulso, colocando
próximo da boca dela e ordenando:
–Beba
o sangue que escorre do meu pulso.
Assim
como ele mandou, ela fez. Ficou uns trinta segundos sugando aquele
sangue, com os olhos fechados. A pouca força que estava se
transformou em muita e ela abriu os olhos pela primeira vez depois da
transformação. Eles estavam semelhantes aos de Cinna, com aquela
profundidade misteriosa.
Sentiu
aquela força nova se espalhar por seu corpo e caiu na cama.
Encontrava-se bem melhor e renascida.
–Seja
bem-vinda, querida. Como se sente?
–Melhor
do que nunca estive!
–Renascer
é bom, não é?
–Acho
que sim!
–Ainda
me lembro como aconteceu comigo.
–E
como foi?
–É
uma longa história, tenho a eternidade para te contar isso. Alias,
tenho muitas outras coisas para te contar. Só que primeiro deve
estar com fome. Vamos alimentar você!
Ele
chamou uma das empregadas ao quarto e ensinou Amélia a se alimentar.
–Obviamente,
vai morder o pescoço dela. Não chupe o sangue todo, senão a
matará. Se sacie apenas.
A
mulher parecia meio aérea no quarto.
–E
porque ela está assim?
–Arte
da dominação. Eu te ensinarei isso. Usada para controlar os mortais
e se alimentar deles sem que eles sem lembrem de nada. Por isso que
ninguém nessa casa suspeitava de mim e nem suspeitará de você
agora. - ele sorriu maliciosamente – Vamos! Alimente-se! Sacie-se!
Ela
colocou os caninos para fora e mordeu o pescoço da mulher de meia
idade com vontade. Alimentou-se até que ela desmaiou, depois
solta-a.
–Muito
bem! Aprendeu rápido! Ajeite ela na cama e saia daí. Troque-se.
Comemoraremos o seu aniversário e também renascimento.
Esperar-te-ei lá em baixo.
Cinna
saiu do recinto. Amélia arrancou a camisola. E impressionou de ver
seu reflexo no espelho. Mesmo ela se tornando vampira, conseguia se
ver no espelho? Os livros erraram em algumas coisas.
Observou,
seminua, como seu corpo estava. De uma certa maneira ele estava mais
curvilíneo e seus seios pareciam mais arrebitados. Observou melhor
sua face e percebeu aquele olhar que lhe incomodou por anos. Gostou
de como ficou com aquilo. O resto de suas feições estavam como
sempre foram. Limpou o resto de sangue da boca e, colocando-os para
fora, atentou-se aos seus caninos. Eram a afiados e compridos. Mas
não teve medo e nem se assustou. Eram dela. Tudo aquilo era dela.
Encostou
a mão no peito e não sentiu nada, isso a incomodou um pouco. Com
certeza sentiria falta do seu coração bater, ainda mais quando
reencontrasse aquele que a livrou da depressão.
Ela
colocou um vestido vermelho, o mesmo que usou no aniversário de
Cinna e quando conheceu Mark. Será que ele se transformara também?
Só o tempo a responderia.
Passou
sua primeira noite como vampira com Cinna lhe contando todos os
princípios do clã e de tudo o que ele a ensinaria a fazer. Seu
treinamento começaria na noite seguinte.
Estava
perto da hora de amanhecer e Cinna falou:
–Está
na hora de deitarmos.
–Acho
que essa será a parte que eu menos gostarei. Ter que dormir durante
o dia e acordar só a noite.
–Também
não gostava muito, mas eu me acostumei. Com certeza irá se
acostumar também.
Subiram
a escada. Cinna se despediu dela.
–Tenha
um bom dia de sono. - riu – Uma nova vida começa para você a
partir de hoje. Aproveite a sua eternidade.
–Obrigada,
Cinna!
Amélia
entrou no quarto e a empregada que foi sua primeira refeição não
estava mais lá, despertara e saíra do quarto. A nova vampira
deitou-se, demorou um pouco a pegar no sono e foi capaz de ver os
primeiros raios de sol saindo por baixo da cortina grossa que Cinna
mandou colocar em seu quarto.
Nas
semanas que se seguiram, em todas as noites, Cinna treinou a jovem
vampira. Ensinou-lhe as artes da dominação, sedução, sentidos
aguçados e até uso de fogo. Também ensinou a garota alguns golpes
de luta, fossem elas corpo-a-corpo, de espadas ou até com armas de
fogo.
Foi
mais de um ano de treinamento até que Cinna declarasse que ela
estava pronta para trabalhar em prol do clã Camarilla.
E
como ela era mulher, obviamente que para sua primeira missão seria
necessário ela usar de seus artifícios femininos.
Sua
missão seria seduzir um dos sabás numa festa, este seria preso e
interrogado. Para ela não interessavam os motivos, apenas tinha que
cumprir a sua parte.
Chegou
a festa e todos se voltaram para ela, realmente chamara muita
atenção. Normalmente, ela ficaria irritada com aquilo, mas ela
estava dentro de sua personagem. Imediatamente, o tal sabá se
aproximou dela. Passaram um tempo conversando, até que subiram para
um lugar mais reservado.
O
outro vampiro achava que ela era uma simples humana, mas se deixou
enganar pelas aparências e trejeitos da garota. Assim, a missão foi
bem sucedida.
***
Os
anos foram passando e Amélia realizava muitas outras coisas para o
clã que entrara. Nunca deixou de escrever seus livros. Já tinha
terminado uns dez. Um destes, inclusive, era inspirado em suas
aventuras como uma vampira recém-nascida.
Passaram-se
pouco mais de trinta anos desde então. A época eram os anos 2000.
Em
mais uma noite, Amélia e Cinna estavam sentados no sofá da sala.
Ele lia e ela escrevia. Cinna puxou assunto:
–Afinal,
Amélia, o que você tanto escreve? Desde de que te dei aquele diário
você não parou mais.
–Eu
escrevo sobre as minhas missões e também criei coisas inspiradas
nos muitos outros livros que eu li.
–Queria
ter a chance de ler um desses. - sorriu
–Não
seja por isso. - pegou um caderno ao seu lado e entregou a ela –
Faça as honras.
Era
sobre um investigador que tinha vários casos a resolver, este não
era nem um pouco inspirado em Mark.
A
noite seguiu em silêncio. Ela prosseguiu escrevendo e Cinna devorava
o caderno, distraído. Amélia que teve que chamá-lo:
–Cinna,
está na hora. Faltam alguns minutos para o amanhecer.
–Por
que isso é tão bom? Simplesmente não consegui parar de ler por
cinco horas seguidas.
–Não
acho que seja tão bom assim, Cinna.
–Como
não? Eu já estou quase no final disso. - mostrou quantas páginas
faltavam
–Nossa!
- ela se chocou
–Você
tem que lançar este livro. Ele não pode ficar trancado por toda a
eternidade neste caderno.
–Calma,
Cinna. Esqueceu que eu não sou uma pessoa normal. Não posso me
lançar como escritora, eu tenho que preservar a minha identidade.
–Quando
eu te disse preservar a identidade é o fato de você ser vampiresca.
É possível viver no meio de humanos, fazendo coisas que eles fazem.
–Entendi.
Então, desta forma, eu vou pensar sobre isso. Pode levar o caderno
com você para terminar. - respondeu num sorriso – Tenha um bom dia
de sono, Cinna.
–Você
também, durma bem!
Ela
subiu carregando os cadernos, entrou em seu quarto e colocou-os na
escrivaninha.
Puxou
a primeira gaveta e pegou um caderno velho, o do primeiro livro que
escreveu, quando ainda era humana. O título dizia: “A preciosa
semana”.
Sempre
lia aquilo quando tinha vontade e se lembrava com carinho de Mark. Os
mais de trinta anos mudaram os seus sentimentos, mas eles ficaram
mais profundos. Passou de paixão a um amor platônico. Provavelmente
Mark era um idoso agora, isso se ainda estivesse vivo. Ela ainda
tinha secretamente esperanças de reencontrá-lo.
Abraçou
a caderno e o pôs de volta em seu lugar. Trocou de roupa e
deitou-se.
Cinna
falou com um de seus contatos e ajudou a sua pupila a publicar o
livro que ele lera. Ele gostara além do esperado, tinha séculos que
não lia algo tão bom.
A
garota teve que reeditar o livro digitalmente e como ele era um
bocado grande, levou um tempo para tal.
Todos
os processos aconteceram e no final de 2009 ela lançava “O
caçador”.
Por
recomendação de Cinna, ela mentiu a idade dizendo que tinha meros
16 anos.
O
livro foi um enorme sucesso e ela lançou mais dois: “A força das
palavras” e “A filha do Sangue”.
Sendo
agora um rosto conhecido, Amélia tinha uma serventia diferente para
os Camarilla. Então, continuou com algumas coisas por baixo dos
panos enquanto cuidava da carreira de escritora.
***
No
ano de 2013, pouco mais de um ano depois do lançamento do último
livro, a jovem vampira concedia uma entrevista para a televisão.
–Então,
quando será o lançamento do próximo livro?
–Eu
não tenho previsão disso.
–Sério?
Não tem mesmo nenhum livro na gaveta? Nenhum que esteja escrevendo?
–Quem
me conhece sabe que eu não escrevo um livro de cada vez, são todos
eles ao mesmo tempo.
–Mas
não tem nada?
Somente
então, se recordou.
–Na
verdade, eu tenho um sim. Foi o primeiro que eu escrevi e nunca
mostrei a ninguém.
–Olha
só, uma notícia em primeira mão da grande Amélia Scarlet. Sobre o
que é este?
–Sobre
dois jovens que passam uma semana na companhia um do outro e se
conhecendo.
–Um
romance? Não sabia que era romancista, Srta. Scarlet.
E
ambas riram. A entrevista aconteceu até o final.
Ela
acabara de revelar o seu maior segredo depois do seu diário: o livro
que escreveu sobre ela e Mark. Obviamente, Cinna perguntou sobre isso
na noite seguinte. Ela apenas foi a seu quarto, pegou o velho caderno
e entregou a seu mentor.
–Ora,
isso é velho em. A preciosa semana... - ele ficou perplexo ao ver a
data – De 1974? Isso é de antes do seu renascimento.
–Eu
sei, Cinna. Você é o primeiro a ler isso, como todos os outros que
te mostrei. Você deve acabar bem rápido, a história é bem mais
simples do que a dos outros.
–Se
você diz.
–Bem,
eu vou ler um pouco na biblioteca.
A
vampira não conseguia se concentrar na leitura, o pensamento de que
Cinna finalmente descobriria o que aconteceu entre ela e Mark há
muitos anos não parava de perturbá-la. Tinha que se preparar
mentalmente para aquilo.
E
conforme ela disse aconteceu, Cinna apareceu com o caderno na mão.
–Então,
o que achou? - perguntou tentando mostra indiferença
–O
livro é excelente como os outros, tem uma proposta diferente dos
outros que lançou até agora.
–E
o que seria?
–Ele
tem uma história menos complexa, porém muito cativante. E tem outra
coisa... - ele se sentou diante dela – Os personagens dessa
história são você e o Mark, o pupilo do meu amigo William?
–Somos
nós sim!
–E
aconteceu tudo isso que está escrito aqui? Inclusive “aquela
tarde”?
–Sim,
Cinna! Todas as linhas escritas ai realmente aconteceram.
–Conseguiu
me esconder isso durante todos esses anos, safada.
–Isso
não interessa mais, talvez ele nem esteja mais vivo. Isso é de
antes de eu ser vampiresca. Então, livro aprovado ou não?
–Claro
que está aprovado! Pode começar a revisá-lo como faz no computador
e eu resolvo as outras coisas.
***
Todos
procedimentos foram feitos e finalmente “A preciosa semana” teria
seu lançamento. Por sugestão de Cinna, a vampira escritora decidiu
que a noite de lançamento seria em Portugal, em uma bela mansão.
Era
mais uma noite de autógrafos como qualquer outra. Ela leu alguns
capítulos do livro e falou com seus fãs e partiu para a sua mesa
para começar as milhares de assinaturas.
Tudo
corria normalmente, ela deixava as dedicatórias para cada uma das
pessoas que diziam seus nomes. Mais uma pessoa veio e ela não olhou
para o rosto da tal, apenas perguntou:
–Qual
seu nome?
–Mark
Drake!
Foi
então que Amélia direcionou seu olhar para cima e viu quem era. Ele
não havia mudado praticamente nada do que se lembrava. Só estava
vestido com trajes típicos de um motoqueiro, um pouco mais barbudo e
também tinha aquele olhar vampiresco que ela já sabia reconhecer.
–Você
não mudou nada, Amélia.
–E
nem você, Mark. - respondeu com um sorriso
Ela
terminou de autografar e estendeu o livro para ele.
–Aqui.
Eu espero que a leitura lhe agrade. Foi bom ver você!
–Obrigado!
E tem mais duas coisas também. - pegou o livro e lhe deu outro –
Autografa meu exemplar de “O Caçador”?
–Claro!
Nossa, pelo que parece ele já foi lido algumas vezes.
–Pelo
menos umas vinte vezes. - comentou rindo
Amélia
riu também e assinou o livro da mesma forma que fez com outro.
–Aqui.
E qual é a segunda coisa? - ela indagou
–Precisamos
colocar nossa conversa em dia... - ela tossiu em falso – Quero
dizer, vamos sair depois daqui?
–Sim!
- falou com um outro sorriso
Mark
saiu e foi para um outro canto, com um senhor que Amélia sabia bem
quem era: William.
Se
ela ainda tivesse um coração que batesse, com certeza ele teria
acelerado com esse reencontro. Podem ter se passado cerca de quarenta
anos, mas ela ainda nutria sentimento pelo, recém-descoberto por
ela, também vampiro.
Sabe-se
que vampiros não tem sentimentos, mas aquilo não eram sentimentos
da Amélia vampira, mas sim da Amélia humana, que se fosse viva, já
seria bem idosa.
Ela
terminou a sessão de autógrafos e retornou a se encontrar com
Cinna. Ele estava na companhia de William e Mark.
–Olha
ela ai! - comentou William
–Quanto
tempo, Sr. William. É bom revê-lo.
–Igualmente,
Srta. Scarlet. - ele baixou o tom de voz – E se tornou ainda mais
bonita entrando para a nossa raça.
–Agora,
senhores, com sua licença, eu levarei esta dama para dar uma volta.
–Pode
ir. Não precisa da minha permissão. - disse Cinna
Então,
os dois vampiros mais novos saíram. Do lado de fora da mansão Mark
deixara sua moto.
–Nossa,
que linda. É sua?
–Sim!
- pegou um capacete para ele e deu outro a ela – Vem, senta na
garupa. Alias, aonde vamos?
–Como
eu sou famosa agora, não pode ser nenhum lugar público. Quer tal
irmos ao hotel onde estou hospedada?
–É
uma boa pedida. Vai ser melhor para conversarmos sem todos esses
holofotes.
Subiram
na moto e seguiram viagem até o hotel. O céu noturno estava limpo e
eles sentiam o vento em seus rostos. Apesar do barulho do motor, eles
conseguiam se ouvir e conversar.
–Eu
li o primeiro capítulo do livro.
–E
o que achou?
–Lembrei
de coisas que aconteceram comigo que devem ter uns quarenta anos.
Somos nós não?
–Isso
é tão obvio para você quanto pro foi pro Cinna. - e riu
–O
Cinna leu?
–Claro
que sim. Ele é a primeira pessoa a dar opinião.
–E
como ele ficou quando descobriu o “nosso segredo”?
–Não
pode fazer nada, isso já tem tanto tempo. Se eu ainda fosse jovem
talvez até tivesse outra reação. Mas, admito que eu fiquei nervosa
quando dei o caderno para ele ler. E também nervosa com todo o
lançamento deste livro. Afinal, é meu próprio passado.
–”Nosso”
você quer dizer.
–É!
Nosso.
A
vampira foi guiando Mark na saída de um local mais afastado para uma
cidade agitada, onde ficava o hotel. Entraram separados para não
levantar suspeitas.
Amélia
o aguardava em frente a porta de seu quarto.
–Seja
bem-vindo. Desculpe a bagunça.
–Acredite,
quando eu fico em hotel consegue ser pior do que isso. - disse,
tirando o seu casaco e sentando na cama – Ai, que fome!
–Agora
que falou, eu também.
–Vai
pedir serviço de quarto?
Quando
ele diz “serviço de quarto”, o serviço mesmo é só fachada. É
para se alimentar de quem vai trazer o tal serviço. Assim que
vampiros fazem.
–Não!
Eu tenho meu estoque aqui. - disse isso pegando uma garrafa com
líquido vermelho e duas taças – Servido?
–O
que é isso? - Mark fez careta
–É
sangue!
–Engarrafado?
–Sim.
Eu não gosto de ficar chamando o serviço de quarto o tempo todo.
Cinna que inventou isso, especialmente para mim. Já que meu rebanho
não pode viajar comigo, recolho o sangue deles e coloco aqui.
–Pensando
bem, é melhor do carregar bolsas de sangue, como fazem alguns. Essas
garrafas se passam facilmente por vinho. - pegou a garrafa da mão
dela – Eu prefiro o método tradicional, mas se é o que temos para
hoje, tudo bem. Só que sem taças.
–Tá
bem! - a vampira riu – Também bebo direto do gargalo.
O
vampiro arrancou a rolha da garrafa e sorveu um grande gole daquele
sangue, segurando com uma mão só.
–Delícia!
- passou a garrafa para ela – Sua vez!
Amélia
também tomou um grande gole, apoiando a garrafa com as duas mãos,
uma no gargalo e outra em baixo.
Eles
passaram um tempo dividindo aquela garrafa de sangue, alternando o
gole de um e de outro. A cena se assemelhava a humanos tomando bebida
alcoólica. A vampira terminou a garrafa e um fio de sangue escorreu
pelo canto de sua boca, caindo pelo queixo.
–Espera.
Caiu aqui! - disse Mark
Ele
aproveitou e bebeu o sangue que escorreu, indo do pescoço até a
boca de Amélia. Roubou um beijo dela. Ao se separarem, ele disse:
–Desculpe-me
por isso. Estava com vontade fazer isso desde que te vi hoje.
–Não
tem problema. - sorriu – Sabe, Mark, acho que se meu coração
ainda batesse ele estaria acelerado agora.
–Acho
que o meu também. Mas abandonamos a vida há muito tempo para sentir
esse tipo de coisa... E ainda assim, o meu desejo por você é
incontrolável.
–Isso
é algo que está além das coisas vampirescas. Nos conhecemos antes
de renascermos e mantivemos nossos sentimentos guardados por anos.
São coisas antigas e fora de controle vindo a tona.
–Você
ainda tem a mesma sensibilidade para perceber as coisas.
Amélia
deixou a garrafa no chão perto da cama, puxou Mark pelo pescoço e
beijou-o. Ela não queria conversar com ele, pelo menos não agora.
Quase sempre ela se lembrava dos dias que passou com ele no passado e
como tinha saudade do corpo dele. Ela lembrava que ele era quente,
agora não mais, contudo não se importava com esse detalhe. Imaginou
por anos como seria o seu reencontro com ele e estava se saindo
melhor do que ela esperava.
Os
dois vampiros emendaram um beijo no outro e trocavam amassos na cama.
Aqueles corpos frios enroscados e que não conseguiam se soltar. Mark
percebia bem a intenção da sua semelhante com aquilo e teve que
interromper.
–Amélia!
–Que
foi, Mark? - olhou nos olhos dele
–Não
podemos fazer isso.
–E
por que não?
–Não
precisamos disso e nossos corpos não tem mais capacidade para tal.
Se você entende o que eu quero dizer.
–Você
quer dizer que não capaz de ter uma ereção?
–Não
é isso! Eu até consigo, manipulando o meu sangue para o lugar
certo. Mas é que nós, vampiros, não temos necessidade de praticar
sexo.
–Eu
sei, mas não quero chegar até este ponto com você. - ela disse, um
bocado chateada – Quer mais sangue?
–Quero.
Mas, antes, - pegou no braço – podemos terminar o que fazíamos?
–Achei
que não quisesse.
–Os
amassos, eu quero sim.
Eles
passaram mais alguns minutos trocando beijos e carícias.
A
vampira pegou outra garrafa de sangue e enquanto partilhavam desta,
conversavam:
–Por
que não me conta como foi seu abraço?
–Foi
no meu 20º aniversário, eu estava definhando na cama por causa
daquela “doença de família”, então Cinna me ofereceu a
proposta a fim de me livrar daquilo. Não tinha nada a perder e
aceitei!
–E
como se sentiu quando ele te mordeu e tirou quase todo o seu sangue?
–Eu
me senti mais fraca do que já estava, me esforçava para os olhos
não fecharem. Mas, depois que eu bebi o sangue dele, toda a força
voltou e eu me senti mais viva do que nunca, se é que essa é a
palavra certa. E a sua, como foi?
–No
meu 21º aniversário, William me deu duas opções: Dinheiro para
viajar pelo mundo e nunca mais vê-lo ou ser seu sucessor e continuar
ao seu lado. Por gratidão, eu escolhi sucedê-lo. Só senti o meu
enfraquecer e a minha respiração ficar mais fraca, após a troca de
sangue, as forças voltaram.
–Pelo
menos a sua transformação foi menos sofrida que a minha. Eu já
estava quase morrendo quando fui transformada. Ainda penso que foi
uma forma egoísta de me livrar da doença.
–Preferia
ter morrido sem saber a real causa? Da mesma forma que seu pai? Você
não foi egoísta, apenas pensou no legado de sua família.
–Eu
não pensei no legado da família. Eu não mantenho a empresa do meu
pai, o outro lado da família faz isso, tenho parte das ações da
empresa e já estou até me passando por minha filha.
–E
no que pensou afinal?
–Em
você!
Mark
arregalou os olhos, tentando acreditar no que ouvira. Amélia sorriu,
meio sem graça e beijou-o. Ocorreram outros amassos na cama e eles
fizeram coisas fora das suas reais necessidades.
***
Os
dois vampiros só despertaram novamente ao anoitecer. Mark levantou
primeiro, vestiu suas calças e bebeu o resto do sangue que ainda
tinha na garrafa que compartilharam na noite anterior. Aproveitou
para ler um pouco do novo livro da vampira que dormia no mesmo
quarto. Meia hora depois, Amélia despertou.
–Já
lendo, Mark?
–Ora,
não queria te acordar. Dormiste bem?
–Nunca
dormi tão bem em quarenta anos.
–Vá
se vestir, William nos chamou para uma exposição em um museu na
cidade.
Amélia
demorou um pouco para se vestir e eles desceram para o saguão do
hotel.
Mark
pilotou a moto até o local da exposição e de encontro com os seus
mestres.
–Finalmente
chegaram. - comentou Cinna
–Desculpe
a demora. É que a Amélia demorou a se arrumar.
–Mulheres:
Não mudam nem quando renascem. - brincou William
A
vampira fez uma careta não achando muita graça, peguntou em
seguida.
–E
sobre o que é esta exposição?
–Um
escultor que eu e Cinna conhecemos. Morreu deve ter uns duzentos
anos.
–Que
saudades eu sinto dele. Ele era uma boa companhia!
E
os mais velhos seguiram na frente. Mark e Amélia atrás.
–Lá
vão eles com essas conversas saudosistas. Parece que a noite será
apenas nossa de novo. - falou Mark
–Para
mim, isso já basta. - respondeu com um sorriso e pegando na mão
dele
Então
passaram a observar as esculturas e pinturas que estavam naquela
exposição. Para Cinna e William aquilo era um total lembrete do
passado. Para os mais jovens, eram muito interessantes, mas nada além
disso.
Passaram
algumas horas lá dentro e se sentaram em uma praça próxima. Ainda
era o meio da noite e tinham muitas pessoas na rua. Os quatro
conversavam em um clima muito agradável. Estavam perfeitamente
misturados com os outros, os humanos.
De
repente, pode-se ouvir um burburinho por conta de um homem jovem que
vinha com uma pistola na mão. E ele vinha na direção de Amélia,
falou diretamente com ela:
–Você...
Sua maldita!
–Ei,
o que é isso, cara? - perguntou Mark
–Ela
manchou o nome da minha família. - disse nervoso – Amaldiçoou a
família Scarlet.
–E
quem é você, senhor?
–Sou
Leonelo Scarlet, filho de Ivan Scarlet, neto de Alvar Scarlet. A
minha parte da família cuida da empresa, enquanto essa ai mente para
nós.
–E
com que base você faz essas acusações? - indaga Amélia
–Olha
só para você! Tem anos que sua aparência não muda, meu avó se
lembra exatamente de como era e quando ele a descreve é a pessoa que
eu vejo agora. Está se aproveitando da nossa família para se
manter, se fazendo de geração seguinte, ainda lança livros bobos
para leitores tão ruins quanto seus livros. Além de se passar por
alguém de meros 21 anos.
Cinna
já estava ficando nervoso. Não era algo bom quando alguém
descobria sua identidade, ainda mais se fosse alguém da própria
família.
–E
o que eu fiz de mal para vocês? Eu só estou vivendo a minha vida,
só isso.
–Egoísta!
Sua egoísta maldita! Está sugando a reputação da nossa família
se tornando um monstro que não envelhece. Está fazendo isso para
ficar com todas as riquezas no final e só para você. Esqueceu da
empresa, largou-a em nossas mãos. Mas a sua parte nas ações? Delas
você não esquece.
Todos
os quatro vampiros estavam se sentindo incomodados com toda a
situação, já estava despertando muitos curiosos e dessa forma não
teriam como se livrar dele. Amélia tentava se defender dos
apontamentos.
–Nunca
fui boa em cuidar da empresa, deixei isso a cargo de quem sabe, assim
como minha mãe disse para fazer. E minha porcentagem nas ações é
ínfima se for comparada aos lucros totais. Meus livros me dão mais
dinheiro.
–Não
me importam esses detalhes. Eu não quero que carregue mais o nome de
minha família. Os Scarlet sempre foram uma família que aceitaram
seus destinos sem nem pensar duas vezes. Você não merece isso!
Leonelo
ia atirar, porém hesitou.
–Que
foi? - perguntou Amélia – Atira logo!
–Enlouqueceu,
Amélia? - gritou Cinna
–Não
se esqueça, Cinna. Eu não tenho nada a perder. Afinal, as pessoas
que eu amava já se foram.
–Ora,
ainda não tem papas na língua. Não terei pena de você.
–Não
precisa! Ninguém nunca teve pena de mim mesmo. Ainda mais vocês.
Quando papai e mamãe morreram, fiquei abandonada, foi Cinna quem
cuidou de mim. Ele se tornou a minha família e bem melhor que todos
vocês em todos esses anos.
O
humano berrou e puxou o gatilho com vontade. Um tiro estridente ecoou
no ar. As pessoas em volta se horrorizaram. Porém, quem foi atingido
foi Mark. Ele pulou na frente da vampira, derrubando-a e tomando o
tiro no ombro. Seu gemido foi ouvido por Amélia em seguida.
–Está
bem, Mark?
–Estou
sim. É só um ferimento leve.
–O
quê?! - esbravejou Leonelo – Maldito! Vão morrer os dois então.
Ele
atirou novamente, mas seu tiro foi em outra direção, atrapalhado
por Cinna e William. Ele insistiu em continuar tentando. Cinna mandou
aos vampiros mais jovens:
–Mark,
Amélia, saiam daqui agora!
Enquanto
detinham o outro, pularam na moto e foram a um local distante, onde
era a simples casa de Mark. Chegando lá, ela ajudou-o a cuidar do
ferimento. Retirou a bala e fez uma sutura bem a moda antiga: usando
uma faca quente e colocando sob a ferida.
–Assim
está bom. Amanhã já estarei melhor! Obrigado!
–Eu
que agradeço por ter pulado na minha frente, Mark.
–Você
sabe que um tiro no peito é tão fatal para nós quanto para os
humanos. Poderia mesmo ter morrido.
–Eu
sabia que não. Talvez você ou o Cinna tentassem impedi-lo.
–Ele
conseguiu nos deixar muito vulneráveis chamando a atenção, não
podíamos apenas morder o pescoço dele e sugar até desmaiar e
depois fugir. Demandou bem mais trabalho.
–Espero
que Cinna e William estejam bem.
–Aqueles
dois sabem se virar, tem mais tempo nisso do que nós juntos. -
comentou rindo, ficou sério em seguida – Temos que descobrir mais
sobre esse Leonelo Scarlet. O que sabe sobre ele?
–Além
do que ele afirmou, está entrando para a presidência da empresa
Scarlet agora. Está no meio do processo de transição.
–Ele
deve querer mostrar a que veio para os outros como presidente e não
vai deixar barato, junto com o que aconteceu hoje.
–Eu
queria entender todo esse ódio.
–Humanos
sentem ódio, Amélia, tanto como nós. Mas, eles carregam isso além
das gerações, vão passando e as mesmas coisas continuam. Vide que
sua família tem inimigos de três gerações atrás.
–E
agora, inimigos dentro da própria família.
–Para
eles, a inimiga é você. Acham que está atrapalhando, bem, o
Leonelo acha que está manchando o sobrenome.
–Obviamente
foi porque eu não me permiti sucumbir por essa doença ridícula.
–É
o mais provável! E ele afirma que você ainda toma dinheiro da
empresa.
–Não
“tomo” o dinheiro, ele sempre foi meu. Era a parte do meu pai, a
minha e da minha suposta filha, que sou eu mesma.
–Ele
deve estar revoltado porque não participa dos problemas da empresa.
Só pega o dinheiro e pronto.
–Se
é isso que o incomoda tanto, é simples: Vendo minha parte a ele.
Terei como sobreviver independente disso.
–Isso
não resolveria. Ele quer se livrar de você! Pois pensa que é um
monstro, na visão dele, e isso também mancha os Scarlet. Alias,
quem é Alvar Scarlet?
–É
meu primo! Ele já deve ser bem velho. Não entendo o porquê da
doença deles se manifestar mais tarde.
–Ele
não vai descansar enquanto não te matar. Temos que dar um jeito
nisso.
–Melhor
conversar com Cinna sobre isso.
–E
com William também. Eles podem te dar algum bom conselho. -
acariciou o cabelo dela -Vamos relaxar, por ora. Aqui é seguro!
–Ainda
estou incomodada por ele ter falado mal dos meus livros.
–Ele
nunca deve ter lido nenhum deles. É alguém sério demais para ler
os seus romances.
Amélia
sorriu com aquelas palavras e questionou depois:
–Será
que eu poderei pegar as minhas coisas no hotel?
–Ele
já deve alguém tomando conta por lá. Só se for alguém que não
seja você.
O
celular da vampira tocou, era Cinna.
–Onde
estão?
–Estamos
na casa do Mark.
–Ah,
que bom! Achei que estivessem no hotel. Eu tenho que parar de
subestimar o Mark. Ele realmente pensa alguns passos a frente.
–Virá
para cá?
–Claro
que sim. Temos que resolver essa situação o mais rápido possível.
–Tudo
bem! Estou te esperando.
Alguns
minutos depois, os vampiros mais velhos chegaram.
–Como
fizeram para detê-lo? - perguntou Mark
–Depois
de muito segurá-lo, fomos obrigados a apagá-lo. Claro que no método
humano. - respondeu William – As pessoas em volta nos acharam
agressivos, mas nem demos atenção a isso. Colocamos ele deitado em
um banco e viemos para cá.
–Amélia,
vamos nos sentar, precisamos conversar. Vocês dois podem se juntar a
nós.
Os
quatro se sentaram a mesa daquela casa simples. Cinna começou:
–Amélia,
querida, o que aconteceu hoje não podia ter acontecido de forma
alguma. Sua identidade está ameaçada.
–Sei
disso, Cinna. Não foi algo intencional.
–Não
foi a curto prazo, mas sim a longo prazo. Ainda está vinculada a sua
família desde o seu renascimento. Normalmente, os vampiros se
desvencilham da família humana nos primeiros anos. No seu caso, já
se passaram quase quarenta. Isso é tempo demais!
Ela
apenas ficou cabisbaixa, Cinna estava completamente certo.
–Sei
que você ainda é ligada a sua humanidade, mas precisa se livrar
dela, mais cedo ou mais tarde. Deixe a sua família seguir em frente
como se nunca tivesse existido.
–Então,
para o Leonelo parar, ela forjará a própria morte. - afirmou Mark
–É
exatamente isso o que tinha em mente.
–Mas
e a mansão Scarlet e tudo dentro dela? Afinal, aquela é a minha
casa.
–Quanto
a mansão e a sua fortuna como escritora podemos resolver, só passar
para o nome de um de nós três no seu testamento.
–Eu
acho melhor ser para o Mark. - se meteu William
–Concordo.
Ele é o rosto mais desconhecido de nós.
–E
a parte das ações volta para a família? - questionou ela
–Exatamente.
Assim acabaremos com o único vínculo que tem com eles.
–Precisamos
montar um plano para que o Leonelo tenha certeza que Amélia morreu.
- sugeriu Mark
–Deixaremos
isso com você e Amélia. - completou Cinna – Mas, primeiro
resolveremos a parte do testamento. Vamos redigir um aqui mesmo e eu
mexerei uns pauzinhos na data para ela ser de bem antes de hoje.
Assim
eles fizeram. Naquela mesma noite, Cinna registrou o testamento com a
data de um ano anterior.
Mark
e Amélia pensaram no plano para a falta morte dela. Era óbvio que
Leonelo ia querer vingança e ver Amélia sofrer antes de morrer.
Mark previu que ele a raptaria, a torturaria um pouco e depois a
mataria. Nesse momento que vinha a “forja da monte”. Pediram para
Cinna e William arrumarem um corpo falso, como se Amélia morresse
carbonizada. Isso foi até bem fácil.
A
vampira usaria seu poder de fogo para incendiar o local. Obviamente
eles não matariam o humano. Tudo isso foi resolvido no decorrer de
duas noites.
Na
noite seguinte, Amélia estava pronta para colocar um fim na sua vida
de humana e também na sua carreira de escritora famosa.
Retornou
ao hotel e de acordo com as previsões de Mark, ela foi raptada por
Leonelo. Ele arrastou-a até um carro e levou-a a um local afastado
da cidade. Os outros três vampiros seguiram o carro.
Amélia
foi amarrada em uma cadeira e o Scarlet começou seu discurso:
–Deve
estar se perguntando porque eu não te dei logo um tiro? Depois do
que aconteceu antes de ontem, eu preciso ver você sofrer um pouco.
–Vai
me torturar só por diversão? Depois sou eu quem está manchando o
nome dos Scarlet.
–Não
diga isso. Foi você quem começou! Eu só estou lavando a honra da
família. - falou puxando fortemente os cabelos dela, forçando-a a
olhar para ele – Não vou mais enrolar.
Soltou-a
e pegou uma faca. Depressa cravou em uma das coxas de Amélia. Ela só
conseguiu gritar.
–Ora,
então você sente mesmo dor. Maravilha!
E
repetiu o processo na outra perna, que foi seguido de outro grito
dela.
Ambos
foram ouvidos pelos outros do lado de fora. Eles não podiam fazer
nada ainda, isso fazia parte do plano.
Leonelo
foi torturando Amélia em todas partes do corpo. Foram vários furos
e cortes. Na barriga, nos braços e nas pernas.
Achando
que ela seria incapaz de fugir, desamarrou-a da cadeira e a largou no
chão. Era a oportunidade que ela aguardava.
O
momento em que ele se virou para pegar a arma foi o suficiente.
Quando percebeu, o fogo já estava alto.
–O
que fez, maldita?
–Um
favor para você. - disse com um sorriso sarcástico e riu em seguida
As
primeiras labaredas que apareceram diante do céu noturno foram o
sinal para Mark Drake entrar no local carregando o corpo falso.
Leonelo
ainda insistia. Colocou a ponta do cano da arma sob o peito dela, no
coração. Prestes a apertar o gatilho, mas tinha que ter a frase de
efeito:
–Adeus,
Amélia Scarlet! Acabou!
A
vampira foi mais rápida. Puxou o parente e lhe mordeu o pescoço.
Sugou sangue suficiente até ele desmaiar.
–Seu
filho da puta! - ela xingou
Ouviu
a voz de Mark na sequência, ele se aproximou dela:
–Você
está bem? Eu ouvi seus gritos lá de fora.
–Estou
bem. O sangue dele ajudou a fechar alguns dos ferimentos.
–Precisamos
sair daqui. Aqui é bem mais inflamável do que eu pensei. Coloque
fogo no corpo falso e vamos sair daqui.
Como
Mark disse, ela fez. Ele saiu carregando o humano e ajudando Amélia
que ainda tinha dificuldades para caminhar. Os dois alcançaram a
noite exaustos e felizes que o plano deu certo.
As
autoridades foram acionadas por conta do incêndio. Porém, só
encontraram um lugar completamente em cinzas e um humano desmaiado e
fora e perigo.
***
Os
noticiários dos dias seguintes falaram sobre o incêndio e o corpo
carbonizado encontrado. O sobrevivente não tinha ideia de como tinha
se salvado.
Também
houve a confirmação de que o corpo encontrado era da famosa
escritora Amélia Scarlet. O seu enterro foi muito triste para
muitos.
Seu
testamento foi lido e um jovem amigo da garota ficou com todas as
suas propriedades, com exceção da parte dela na Empresa Scarlet.
Amélia
não se sentia tão bem e livre em tanto tempo.
Depois
de alguns dias, ela retornou a sua casa. Ela estava olhando a pintura
de seu pai em um dos salões e falava com a imagem:
–Papai,
me perdoe ter sido tão egoísta. Eu não quis morrer para a mesma
coisa que te matou. Eu decidi continuar sendo uma Scarlet e também
ser vampiresca. Acho que eu fiz errado, mas agora consertei esse
erro. Não existo mais para a família Scarlet. Mas, eu nunca
deixarei de ser uma Scarlet. Porque eu sei que eu honrei o nome desta
família, não da maneira correta, mas, sim, a minha maneira. Agora,
papai, ascendi a uma outra vida.
–Amélia?
- Mark entrou no recinto
–Ah,
diga, Mark.
–Tem
uma carta para você. É do clã!
–O
que será? - ela abriu – Um dos príncipes quer falar comigo. Isso
é um mau sinal?
–Levando
em conta o que aconteceu... Acho que sim!
–Amanhã
a noite. Será que é longe? - e mostrou o endereço
–Não.
O castelo dele não é muito longe daqui.
***
Na
noite seguinte, Amélia foi ao castelo de Elliot Noble, um dos
príncipes da Camarilla. Ele ficou sabendo dos acontecimentos acerca
da jovem vampira e queria tirar as devidas satisfações.
–Vossa
alteza! - cumprimentou-o
–Srta.
Amélia. Acho que sabe bem os motivos de ter solicitado a sua
presença nesta noite.
–Sei
sim, Alteza.
–Pelo
que lembro, solicitei apenas a sua presença, por que tem mais três
com você?
–Perdoe-me,
eles me trouxeram até aqui, não sabia o caminho. Caso queira, eles
podem sair.
–Não!
Não! Está tudo bem. Vamos resolver logo o assunto. - ajeitou-se em
seu trono – Sua máscara quase que foi descoberta, não é? Mas não
foi por que você contou a alguém?
–Sim
e não. Foi um membro de minha família que começou a suspeitar que
tinha algo errado.
–Família?
Ainda tem vínculos familiares? - ele ficou perplexo – Como isso é
possível?
–Eu
tinha. Cortei oficialmente alguns dias atrás. O vínculo que eu
tinha eram apenas as ações da empresa. Tem anos que não os vejo.
–Quando
se entra para o clã da Camarilla, deve-se cortar totalmente as
relações familiares humanas, afinal, agora ela é outra. Cinna não
te disse sobre isso?
–Disse
sim. Eu que fui mesmo teimosa, Alteza, perdoe-me.
–E
como resolveu?
–Eu
forjei a minha morte, com a ajuda deles. - apontou para os vampiros
atrás dela
–Excelente!
Apesar dos pequenos problemas que causou, conseguiu contornar a
situação. Aposto que foram recomendações de seu mestre.
–Sim,
Alteza. - ela se curvou novamente – Eu terei algum tipo de punição
por meus atos?
–Por
favor, se levante, senhorita. Eu não punirei você. Ainda será de
grande valia para a Camarilla agora que voltou para as sombras.
–Obrigada!
–Mas
eu espero que continue com os seus livros. Eles são realmente muito
bons! - falou sorridente – Só espere uns cem anos antes de
lançá-los de novo aos humanos.
–Alteza,
eu me cansei disso. Quem sabe continue apenas como a escritora dos
vampiros.
–Assim
já está de bom tamanho. Seja bem-vinda de volta aos trabalhos da
Camarilla.
–Ah,
Vossa Alteza, ela não pode trabalhar para nós sozinha. - se meteu o
conselheiro
–Sei
disso, conselheiro. Já designei um parceiro para ela. - e apontou
para Mark – O nosso melhor investigador: Mark. Ele está precisando
de companhia e parece que eles já se dão bem.
–Obrigado,
Alteza. - Mark veio a frente e se curvou
–Desculpe
importuná-los esta noite. Estou oferecendo parte do meu rebanho para
desfrutarem, serão meus convidados.
Passaram
parte da noite na companhia do príncipe Elliot, que deixou de ser a
alteza naquele momento.
Os
quatro vampiros voltaram a mansão Scarlet bem antes do amanhecer.
***
Algumas
noites depois, os vampirescos tinham uma festa para ir. Os três
homens já estavam prontos, apenas esperando a única dama.
–Caramba,
por que até as vampiras demoram a se arrumar?
–Amélia
sempre foi assim, William, melhor se acostumar.
–Eu
vou vê-la lá em cima. - se pronunciou Mark
O
vampiro subiu as escadas e bateu a porta. Amélia permitiu sua
entrada. Ela estava olhando o céu pela janela, tomando uma taça de
sangue, da forma que gostava.
–Está
pronta? - falou se aproximando
–Sim.
Só estava me alimentando um pouco e também olhando o jardim. -
Virou o resto do líquido na taça de uma só vez.
–Eu
ainda não acostumei com esse seu hábito, sabia.
–Eu
sei.
Eles
desceram e foram ao destino.
***
Alguns
meses após estava acontecendo outra festa, desta vez na mansão
Scarlet. Era finalmente o casamento de Amélia e Mark.
Não
era uma coisa muito comum de acontecer com aqueles seres. Quando
acontecia era realmente um fato a ser comemorado, tanto que, até o
príncipe Elliot estava presente.
–Meus
parabéns, noivos! Primeira vez em toda a minha eternidade que eu
vejo um amor tão forte entre dois vampiros e também um casamento.
–Obrigado,
Elliot. Mas nosso amor começou bem antes de sermos vampiros.
–Isso
é verdade. - gritou Cinna, do outro canto do salão
–E
tem até um livro. - completou Amélia
–Ora,
qual?
–A
preciosa semana.
–Ah,
eu li este. Agora que eu parei para prestar atenção, os personagens
são mesmo vocês. - comentou ele rindo
Depois
que todos foram embora, o casal foi para o agora quarto deles.
–Faremos
como humanos fazem? - indagou Mark
–Se
você também quiser.
–Com
você, eu quero qualquer coisa.
***
Amélia
Scarlet passou de uma simples humana, órfã e com depressão, para
uma vampira poderosa e apaixonada.
Ascendeu
no renascimento e no amor. Realizou o seu maior sonho, que era
reencontrar Mark. E estava realizando outro: Ficar ao lado dele.
Agora
eles eram marido e mulher, também parceiros no que realizavam em
favor de seu clã.
Amélia
tinha perdido sua família muito cedo, mas arrumou outra com Cinna,
Mark e William. E esta aumentou. Adotaram um órfão e quando ele
tinha idade suficiente lhe concederam “o abraço”.
Ainda
se considerava uma Scarlet, mas uma diferente. Ela era o outro lado
da família. O que abdicou de morrer por uma doença fatal para viver
a eternidade ao lado de quem ama e sem medir esforços para tal.