Minha esposa me chamou para o jantar,
acabei ficando por lá até a hora de deitarmos. E como eu e nem ela
estávamos muito afim, fui ler mais um trecho do diário.
Kazuko, na época do diário, estava
completamente chateada comigo. Eu não sabia o motivo (pelo menos até
algumas horas atrás) e tinha que resolver isso. Essa anotação data
do dia seguinte.
“Querido
diário,
Está um lindo Sol lá fora, pena
que eu não posso sair.
Ontem foi um dia, eu diria, um
tanto estranho. Makoto está com umas atitudes que me deixam com a
pulga atrás da orelha.
Eu ainda fiquei meio chateada com o
ocorrido. Aquele maldito sussurro de nome alheio do Makoto. Ele
percebeu que eu estava meio para baixo e tirou o dia para me dar um
tratamento digno.
O próprio me acordou, e ao
despertar, pude ver que ele trouxe o café da manhã na cama.
-Bom dia, Kazuko! - falou com um
sorriso
-Bom dia, Makoto. - bocejei –
Para quê isso? - apontei
-Você ficou meio mal ontem, só
quero te agradar.
-Obrigada. - sorri
Acha mesmo que seria mal educada ao
ponto de não agradecer?
Comemos junto ali mesmo, e em
seguida, iria tomar meu banho matinal.
-Por que não usa a banheira daqui?
-Até que não é má ideia.
Adentrei ao banheiro da suíte e
enchi a banheira, sem me esquecer de colocar os sais de banho de
minha preferência. Tirei a roupa e entrei, sentei e reclinei a
cabeça, respirei fundo. Ouvi a voz de Makoto em seguida:
-Eu posso tomar banho com você?
Ele me perguntou? Foi isso mesmo?
-Pode! - não podia responder de
outra forma
Ele se despiu e sentou-se atrás de
mim, me abraçando. Que coisa desconfortável!
Pôs
o queixo na curva do meu pescoço e indagou:
-Por que você chorou ontem?
-Hormônios.
Eita porra de desculpa esfarrapada.
-Entendo.”
Eu
realmente caí nessa desculpa. (risos)
“Suas
mãos estavam sob a minha barriga, acariciando o bebê.
-Engraçado... Você não tem
vomitado mais.
-Eu já acostumei. Só tô um
pouquinho enjoada porque acabei de comer.
Peguei o sabonete e comecei a
limpar os braços e peito.
-Deixa que eu passo nas suas
costas. - se pronunciou
Entreguei o sabonete a ele que
passou nas minhas costas.
-Quer que eu lave as suas também?
-Deixo você me ensaboar todo. -
falou rindo”
Vai dizer que não é bom quando
alguém dá banho em você?
Eu estava aproveitando para ter alguns
momentos mais afetivos com a Kazuko, afinal, nós teríamos um filho
juntos. E também havia essa história de “encararmos isso juntos”.
Desde sempre quis ter uma relação mais próxima com ela, e esta
estava sendo a oportunidade perfeita.
“Realmente,
o que deu nele?
Eu
me enxaguei e passei o sabonete em Makoto depois.
Fui ao meu quarto e troquei de
roupa. Dirigi-me a biblioteca e peguei alguns livros de gravidez,
tudo por curiosidade. E não esqueci do meu chá.
Fiquei algumas horas lendo, sentada
no sofá. Não percebi o tempo passar, só ouvia Makoto mexendo com
as panelas e outras coisas. Também sentia o cheiro da comida. Ele me
chamou:
-Kazuko, almoço.
-Não sabia que você fazia sopa.
-Keiko me ensinou. Temei para
acertar, agora sempre dá certo.
Era uma simples sopa de legumes,
mas que estava uma delícia. Eu até repeti, coisa que não costumo
fazer.
-Parece
que tá com fome, hein.
-Acho que comendo por dois, não é
uma coisa estranha. - soltei um bocejo – E também esse sono
interminável...
Makoto sorriu.
Eu
saí da mesa e me deitei no sofá. Acabei adormecendo. Acordei com
Makoto me chamando e me pedindo para trocar de roupa. Íamos dar uma
volta, já que ele estava sem a costumeira “roupa de casa”. Fiz
conforme ele disse. Parecia que preparara algumas coisas para
comermos. Será que iríamos tão longe assim?
Ainda
era o meio da tarde quando saímos. Makoto saiu da cidade e começou
a subir a montanha. Curvas e mais curvas. Elas estavam me deixando
enjoada. Já conhecia aquele caminho, só não recordava dele tão
nitidamente. Fomos para lá durante a noite. O mesmo lugar onde
vislumbrei a vista noturna da cidade.”
Pois é, eu e Kazuko gostamos muito
deste lugar. Já perdi as contas de quantas vezes fomos lá.
“Chegamos,
e ele estacionou o carro, tirando as coisas da mala em seguida.
Montou um piquenique em baixo de uma das árvores.
Olhei surpresa para ele.
-Piquenique, Makoto?
-É! E também veremos o
pôr-do-sol. Que foi? Que cara é essa?
-Eu nunca fiz um piquenique antes.
Bem, do “meu lado da cidade” mal tem árvores.
-Sei
disso! - sorriu – Porém, nunca é tarde para uma primeira vez. -
fez um gesto para que me sentasse – Trouxe uns sanduíches, sucos,
frutas e bolo
-Oba! - comentei”.
Vocês devem ter uma curiosidade sobre
como é o “meu lado da cidade” que Kazuko tanto falava.
Permitam-me esclarecer.
A cidade onde moramos, Ioma, é
dividida em dois lados: O “rico” e o “pobre”.
O
lado rico é constituído por muitos prédios altos e mais adiante,
as casas. Podemos ver o céu limpo por entre os prédios cinza-claro.
As ruas são limpas, claras, com árvores e bastante trânsito.
Muitas pessoas dia e noite. Já o lado pobre, também tem muitos
prédios e casas. Porém, não há quase natureza alguma. O céu lá
é sempre cinzento e chove na maioria dos dias. As ruas são cheias
de sujeira. Realmente lá tem um ar mais sombrio, principalmente à
noite, quando as ruas são mais vazias e os centros de escravos estão
abertos.
“Comi
algumas coisas e o sono veio, outra vez. Bocejei.
-Quer descansar? Deita aqui. -
falou Makoto, sinalizando o seu colo – Só não durma, senão vai
perder o Sol se pondo.
Bem, era melhor deitar no colo dele
do que na toalha esticada na grama. Assim o fiz, e ele começou a
mexer em meus cabelos e perguntou (algo até normal pelas
circunstâncias, mas estranho por ser para mim):
-Então, Kazuko, você pensou em um
nome?
-Nome?
-Para o nosso filho.
-Ah, pode ser o nome que você
quiser.
-Mas não chegou a pensar em
nenhum?
-Pensei sim. Se for menina: Kimiyo.
Se for menino: Kazuhito.
-Eu gosto de Takumi.
-Takumi? É um belo nome.
-Sempre imaginei que teria um filho
com esse nome, mas gostei dos que escolheu.
-O próximo pode se chamar Takumi.
-Próximo? - ele quem se chocou
dessa vez
-Não vai querer outro no futuro?
-Claro que sim! - ele respondeu,
encabulado – Mas não é hora de pensar nisso.
-Eu só comentei, Makoto. - falei
rindo
Ficamos alguns minutos em silêncio.
-Olha, Kazuko, hora do pôr-do-sol.
- ele me chamou
Levantei,
e passamos a observar a paisagem. Eu vi o Sol se escondendo
devagarzinho por entre as montanhas. Era laranja e amarelo, misturado
com o verde das árvores. Uma vista tão bonita quanto as luzes
noturnas do outro dia. Nunca vi o Sol se pôr de maneira tão nítida
e bela. É muito difícil vê-lo por entre todos os prédios. Eu me
permiti chorar, não sei o porquê, só chorei.
-Kazuko, tá tudo bem?
-Tudo bem, Makoto. - respondi,
enxugando as lágrimas – Eu jamais vi nada igual a isso na minha
vida.
Ele
me abraçou, me consolando e proferiu em seguida:
-Acho que viver do lado pobre da
cidade te privou de muitas coisas simples.
Não disse mais nada depois disso.
Eu chorei por mais uns minutos e quando já estava escuro, voltamos
para casa.
Comi mais um pouco da sopa e fui
ver algo na televisão e acabei pegando no sono. Despertei sentindo o
meu corpo sacudir, como se se alguém me carregasse. E era isso
mesmo. Makoto me levava até a cama. Ele viu que eu abrira os olhos:
-Desculpe. Eu te acordei. Já vai
poder dormir de novo, estamos chegando.
Ele abriu a porta do meu quarto com
o pé, já que estava entreaberta. Colocou-me na cama e se deitou ao
meu lado. Desejou-me boa noite, me deu um beijo na testa e eu apaguei
de novo.
Levantei
hoje com ele me chamando. Fizemos todas as coisas rotineiras e antes
de se despedir, ajoelhou-se diante de mim e beijou a minha barriga.
Tudo bem que eu permiti, só que eu fiquei muito envergonhada da
Keiko ter visto essa cena.
-Ai,
ai. Nunca imaginei que o Makoto fosse fazer isso. Ele parece estar
tão feliz pelo bebê.
Eu sorri, concordei e depois, vim
para cá.
Bem, diário, agora cuidarei dos
meus outros afazeres.”
E a anotação terminou, com um enorme
bocejo na sequência.
Pus o diário na mesa de cabeceira e
me ajeitei para dormir. Tinha trabalho no dia seguinte.
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