terça-feira, 14 de julho de 2015

Capítulo 25 - Aniversário de Kazuko

No meu intervalo de almoço, enquanto o escritório estava vazio fui ler mais um trecho do diário.
O que eu estava preparando para Kazuko era uma digna festa surpresa. Mas eu chamei pessoa de quem ela gostava muito: família e amigos. Entrei em contato com a mãe dela, Saiko, e organizei tudo com a ajuda dela. Ela se tratou de chamar os convidados e eu auxiliei com o resto. Decoração, doces, bolo, outras coisas. Combinei também o horário que levaria Kazuko, já que a festa seria na antiga casa dela, do lado pobre da cidade. Aproveitei e pedi um dia de folga para isso.
Li um pouco e finalmente cheguei a data do dia seguinte do aniversário dela. Foi quando escreveu sobre a surpresa.
Querido diário,
eu sou agora uma pessoa maior de idade. Completei dezoito anos finalmente. Não foi do jeito que eu queria que fosse, de acordo da forma que a minha vida se encontra agora. Mas até que foi melhor do que pensei que seria.
Eu acordei bem desanimada e cheguei até a ficar pior ao olhar o calendário. Makoto abriu a porta, ele estava vindo me acordar. Só que como já estava desperta, falou me abraçando:
-Feliz aniversário, Kazuko!
-Obrigada, Makoto! - respondi desanimada
-Ora, vamos, pare com isso. Hoje é seu dia.
Então, notei que horas o relógio marcava.
-Não vai trabalhar?
-Não! Passarei o dia com a aniversariante.
-Ah, Makoto. O que vamos fazer? - indaguei já esperando uma lista de atividades que seriam bem chatas
-Eu tenho uma surpresa para você.
Fiz uma careta, contudo uma pontinha de curiosidade veio também. Acabei de me arrumar e descemos. Entrei no carro e ele pegou um lenço e iria amarrá-lo no meu rosto.
-Ei! - reclamei
-Preciso vendar você para a surpresa.
-Eu fecho os olhos quando estivermos perto.
-Não! Tem que ser durante o caminho todo.
Soou como uma ordem. E eu acatei. Ele me vendou e seguimos viagem. Foi uma boa meia hora sem ver nada. Não sabia o que pensar, só sentia o carro andando. E de repente, percebi que ele parou. Makoto bateu a porta do carro abriu a do meu lado depois e me guiou na saída do carro. Andei um pouco e senti um cheiro familiar. Ele me levou até o lugar e tirou a venda. Ouvi e vi pessoas conhecidas gritando “Surpresa” e depois parabéns para mim. Um sorriso, que há tempos não fazia, se acendeu. Minha mãe correu para me dar um abraço, minhas amigas em seguida. Recebi também “Feliz aniversário” delas.
Todos presentes. Família e amigos. Eles me fizeram uma festa surpresa, algo que nunca tive na vida. O ambiente da minha, agora antiga, casa estava como em todos meus aniversários. Decorado com balões, fitas, uma mesa com doces, bolo e uma faixa escrito: Feliz Aniversário, Kazuko. Esqueci do Makoto e fui ficar com meus convidados.”
Pois é, eu fiquei em um canto isolado durante toda a festa. Somente Saiko que vinha falar comigo de vez em quando. Mas, isso faz parte.
Minhas amigas contaram como andavam suas vidas. Algumas completaram dezoito anos e curtiam sua liberdade. Outras ainda com medo de serem compradas por serem obrigadas a ir ao centro de escravos todas as noites. Logo, elas foram querer saber como eu estava:
-E você, Kazuko?
-Eu estou bem. Levando tudo na medida do possível.
-Poxa, o seu dono te trata tão mal assim?
-Pois é, ele que organizou essa festa para você. Falou com a sua mãe e também viu o melhor horário para que pudéssemos comparecer.
Eu não sabia desse detalhe. Procurei por ele e o vi em um canto, ele me sorriu. Respondi.
Outra amiga continuou:
-Mas tem alguma coisa. Você tá com uma carinha abatida.
-É! Aconteceram umas coisas.
Acabei contando os ocorridos dos últimos meses, destacando o incidente no aniversário do Makoto e minha gravidez.
-O quê? Ficou grávida? Como?
-Ficando oras! Não pude tomar o remédio por uns dias e aconteceu.
-E ele? O que fez quando descobriu?
-Ele me apoiou. E fez da mesma forma quando perdi.
-É, Kazuko, tirou a sorte grande. Conseguiu um bom dono!
-E bonito também!
Todas nós rimos desse comentário. Passamos as horas seguintes falando besteira e jogando conversa fora. Infelizmente, elas tinham que sair. Algumas voltariam para casa, e outros iriam ao centro de escravos.
Cantamos o parabéns, cortamos o bolo e os convidados foram embora. Isso indicava que logo eu voltaria também.
Ajudei a minha mãe a arrumar tudo e fui ao meu quarto para poder sofrer de nostalgia.
O quarto estava do mesmo jeito que me lembro. Vi todos os meus livros na estante, minha escrivaninha e minha cama, onde eu deitava todas as noites e agradecia por ter mais um dia de liberdade. Com exceção de uma noite, quando fui comprada por Makoto, o travesseiro sabe o quanto chorei.
Joguei-me na cama e respirei fundo. Pensei em tudo o que passei. Foi ruim, mas poderia ter sido bem pior. Minhas amigas têm razão: tirei a sorte grande, consegui um bom dono.
Makoto entrou.
-Kazuko, hora de voltarmos.
Sabia que isso chegaria. Levantei. Ele continuou:
-Este era o seu quarto?
-Era!
-É bem a sua cara! - comentou com sorriso no rosto – Se quiser pegar algo para levar.
-Posso?
-Claro que pode. Estou te esperando lá em baixo.
Só peguei alguns livros que estava com vontade de ler de novo e os meus presentes. Despedi-me de mamãe.
-Tchau, mãe. Foi tão bom te ver.
-Também acho, filha. Feliz aniversário de novo e se cuide em, fiquei assustada com essa história da gravidez.
-Eu sei. Se eu pudesse conversar com você quando aconteceu. Mas o que podemos fazer, né, mãe? Eu não comando a minha vida.
-Adeus, Sra. Saiko.
-Tchau, Makoto. Foi um prazer te conhecer.
-Igualmente.
Abracei-a forte e entrei no carro. Makoto me perguntou no caminho se eu me diverti, respondi que sim. Cheguei a casa e estava organizando meus presentes no quarto. Logo, Makoto me interrompeu para o jantar que Keiko deixara pronto, pois foi embora mais cedo. Iria voltar ao que fazia, contudo Makoto pediu minha presença no quarto.
-O que foi, Makoto?
-Ainda estão faltando alguns presentes meus.
-Achei que a festa fosse o meu presente.
-Também. Só que tem mais coisa.
Eu me aproximei da escrivaninha dele e tinham três embrulhos. Um maior, um médio e um mais comprido, porém fino. Escolhi o maior primeiro. Era um computador portátil. Uma caixa que ser ligada projeta a imagem para frente e seus mecanismos de uso (mouse e teclado) são projetados do outro. Um computador holográfico. Abri um sorriso e agradeci. Fui ao próximo, de tamanho mediano. Este era um celular, tão fino e transparente quanto uma placa de vidro. Agradeci novamente e questionei:
-Para quê tudo isso, Makoto?
-Calma! Abra o terceiro presente.
Fiz o que ele disse e quase cai para trás. Era um documento. Seria uma carta de alforria? Não! Quando li melhor vi que era só para “liberdade diurna”. Havia uma espécie de identidade com uma foto minha.”
Isto foi o motivo que me fez chegar mais tarde em casa. É algo que existe, mas, como é raro, é bem complicado de fazer.
-Liberdade diurna? O que significa isso?
-Quer dizer que pode sair daqui durante o dia. Passear, visitar seus parentes e o que mais quiser.
-Sério? - falei empolgada
Ele assentiu.
-Obrigada, Makoto. - abracei-o, mais feliz do que podia imaginar
Quando desvencilhei dele, ele estava sorrindo e me olhando nos olhos. Ficou parado por uns segundos, antes de se aproximar e me beijar. Exatamente isso: ele me beijou! Puxo-me para perto de seu corpo e eu correspondi aos movimentos dele instintivamente. Não sei o porquê!”
Esse beijo não estava no script. Foram os meus sentimentos por Kazuko já aparecendo.
O momento que nos separamos foi uma troca de risos bobos e Makoto dizendo que faltava ainda mais uma coisa. Mandou-me deitar na cama e assim fiz.
Tirou apenas a parte de baixo das minhas roupas. Masturbou-me um pouco com os dedos. Pensei que ele arrancaria as calças e começar o que interessava, mas não. Ele dirigiu a cabeça para minhas partes íntimas e eu senti uma lambida em seguida. Não achei nojento, aquilo me excitou. Ele continuou fazendo. Lambia, sugada, mordiscava, explorava cada canto daquele lugar. Eu respondia com gemidos agudos que começavam a me secar a garganta.
O dedo voltou junto com a língua depois, o que aumentaram ainda mais os meus sons. Ele manteve o ritmo por alguns minutos, até que eu senti um calafrio subir na espinha e eu soltei o gemido mais forte que consegui. Makoto saiu com sorriso malicioso e comentou:
-Você gozou. Achei que tinha enferrujado nisso. Pode colocar sua roupas e voltar pro seu quarto.
-Makoto! - chamei-o – Vem! Faça isso comigo.
-Como é que é?
-Transa comigo!
Ele podia bem me ignorar, mas acho que os meus gemidos o excitaram. Penetrou e começou os movimentos de vai e vem, devagar e acelerando logo em seguida. Não tinha controle dos sons que emitia, eles apenas saíam, a cada estocada que Makoto dava. Eu devia estar mais sensível que o normal.
Após alguns minutos, ele finalmente gozou, deitou-se sobre mim, tentando recuperar o fôlego. Pude ouvi-lo sussurrar:
-Kazuko.
Sorri por dentro. É uma sensação boa quando dizem o seu nome nessa circunstância.
A atitude seguinte dele me impressionou. Levantou e me deu outro beijo, este que foi tão bom quanto o anterior. Dessa vez não teve nenhum riso. Ele me olhou sério, saiu de dentro de mim e se ajeitou, ficando de barriga para cima. Colocou a minha cabeça sob o seu peito, desejou-me boa noite e adormecemos.
Eu ainda estou tentando entender o porquê dos dois beijos. Admito que gostei! Só quero saber os reais motivos dele para tal.
Agora, tomarei meu banho matinal.”
Os motivos para tudo isso foram eu simplesmente querer ver Kazuko bem, ainda mais depois do que ocorrera. E também já estava me apaixonando por ela. Só não sabia disso ainda!

domingo, 3 de maio de 2015

Capítulo 3 - Nada mais do que a verdade

O  dia seguinte era um dia decisivo para Akemi, definiria o que ela  exatamente iria fazer e o que aconteceria por consequência de sua  gravidez.
Logo após o almoço chamou Tsuyoshi para ir a sua casa, enquanto a irmã dela foi tomar um banho.
Aiga Yoko tomou um susto quando voltou a sala e viu a irmã com um garoto.
-Akemi, o que significa isso?
-Nee-san, tenho algo importante para te contar. Melhor se sentar!
-Eu quero é saber quem é esse!
-Eu sou Washiyama Tsuyoshi, colega de classe da Aki-chan. - tratou-se de fazer a apresentação
-Com essa intimidade toda já? Obviamente vocês já fizeram o que estou pensando.
-Yoko, senta logo, por favor.
-Calma! - disse sentando-se diante deles - O que seria tão importante a ponto de te fazer ficar desse jeito?
-Veja isso primeiro. - e deu os exames que fez no dia anterior para Yoko – Eu fiz isso ontem!
-Uma ultrassonografia? Por quê? - então ela viu – Espera ai! Isso é um teste de gravidez, Aki? E positivo? Me explica isso!
-É sim um teste de gravidez. E sim, deu positivo. Eu estou grávida!
Alguns segundos de silêncio e a mais velha explodiu.
-Aiga  Akemi, o que eu vivo te falando e você não fez? Agora como vamos  resolver isso? Eu não faço ideia do que fazer com você! - bufou – Alias,  quem é o pai dessa criança?
A  adolescente começou a gaguejar uns “Eu... Eu...”, hesitando em  responder a pergunta, com medo da reação de Yoko a sua resposta.
-Eu sou o pai! - Tsuyoshi soltou, em tom firme, se levantando do sofá
-Pelo  menos arrumou alguém com responsabilidade para assumir o que fez. -  virou-se para o garoto – Mas, Washiyama-san, ainda sim terei que chamar  meus pais, para eles resolverem isso. Afinal, os dois são menores de  idade.
-Não, irmã, isso não! - Akemi disse
-Isso sim! Quero que eles vejam o quê a caçulinha deles aprontou.
E o celular do garoto tocou, era o irmão dele.
-Fala, Ken-chan!
-Cadê você? Estão fazendo um escândalo aqui do lado.
-É... - gaguejou – Eu estou aqui do lado.
-Quem é no telefone, garoto? - gritou Yoko
-Meu irmão.
-Me  dá isso aqui! - tomou da mão dele – Alô? Olha só, nós estamos com um  problema aqui e acho muito bom você vir ajudar o seu irmãozinho a  resolver a merda que ele fez.
-Como é que é? - falou o outro Washiyama
-Venha ao apartamento 407. Temos um assunto sério a conversar!
Cerca de uns segundos depois a campainha tocou. Tsuyoshi foi atender.
-O que você aprontou? - cochichou para o irmão
Kenichi tirou os sapatos, seguiu pelo pequeno corredor até chegar a sala, sendo seguido pelo outro.
-Me chamo Washiyama Kenichi. Yoroshiku onegai shimasu!¹
-Eu sou Aiga Yoko.
-E eu sou Aiga Akemi, sou colega de classe do Tsuyoshi-kun.
-Então, qual é o assunto? - disse cruzando os braços
-A minha irmã está grávida e o seu irmão afirmou que é o pai. Precisamos resolver isso!
-Nii-san, isso é verdade?
-É sim! O filho que a Aki-chan carrega em seu ventre é meu.
-Eu  quero saber como vamos resolver isso. - esbravejou Yoko – Ambos são  menores de idade e obviamente não tem noção dessa responsabilidade. O  melhor a fazer é o aborto e deixar essa história para lá, mas acho  chamar os meus pais.
-Eu  concordo com você. Deveríamos chamar nossos pais para eles decidirem o  que fazer. - Kenichi olhou para Akemi aos prantos – Só que a opinião da  sua irmã também prevalecerá nesse caso, afinal, ela será a maior  afetada. O que você quer fazer, Aiga-san? - falou ajoelhando-se na  altura dela
-Eu ainda não sei. - disse soluçando – Eu descobri isso ontem, o Tsuyoshi-kun me apoiou tanto.
-Eu  sei. Só dele estar aqui, sei que sua afirmação é verdade. - tentou  animá-la um pouco – Não acha que a presença dos seus pais não a ajudaria  a tomar a melhor decisão?
-Talvez sim, talvez não. Eu levaria um sermão primeiro!
-Pais dão sermões, é assim mesmo. Eles com certeza te apoiarão no que decidir.
-Eu espero que seja assim. - sorriu
-Então, o que faremos? - perguntou Yoko, de novo
-Chamar os seus e os meus pais. Assim, todos nós saberemos o que fazer tomando a melhor escolha possível.
-Vai chamar mesmo eles? - indagou Tsuyoshi
-Sim!  Melhor que estejam todos aqui. Até lá, só podemos esperar. - ele olhou  para Yoko – Avise-os para vir imediatamente, farei o mesmo.
-Certo! - ela assentiu
-Agora, com sua licença, eu e meu irmão retornaremos para casa.
Ambos fizeram a reverência e saíram. As duas irmãs ficaram sozinhas e Yoko soltou:
-Irmã,  ainda estou impressionada com você. Eu devia estar preparada para algo  do gênero, mas acabei sendo surpreendida. Que falta de responsabilidade!
-Não me acuse, Yoko. Pelo menos eu estou assumindo o que fiz.
-Pelo  menos o Washiyama-san veio aqui com você e assumiu a bronca junto  contigo. É difícil um garoto ser assim. Ele deve gostar muito de você,  Aki.
-Deve sim, Nee-san.
-Agora  deixa eu ligar para a Haha² e o Chichi³. Eles tem que vir aqui ainda  esta semana. - olhou para o alto e devaneiou – Até que o irmão dele é  bonito!
-Pare de ser tão atirada, Yoko.
-Só estou comentando. Olhar não faz mal!
Akemi  não evitou de soltar uma risada, depois foi para o seu quarto para  tentar estudar um pouco, caso o sono deixasse, enquanto sua irmã fazia a  ligação.
***
Os irmãos voltaram ao apartamento 406, o deles. Kenichi imediatamente questionou o irmão:
-Esse filho não é seu né?
-Eu já te disse que é sim. Esqueceu?
-Não  minta para mim. Você já falou da Akemi uma série de vezes e nem chegou a  se declarar para ela ainda. E em sã consciência você não a  engravidaria.
-Seu  senso de dedução é realmente impossível, Nii-san. - bufou – Mas, por  favor, que a sua “descoberta” fique em segredo. Eu prometi a Aki-chan  que iria ajudá-la.
-Eu espero que ela não esteja se aproveitando da sua boa vontade. Espero que ela não faça você quebrar a cara.
-Ela  não faria isso, pode ter certeza. Foi a única para quem ela conseguiu  pedir ajuda, quer dizer, teve que explicar o teste de gravidez que caiu  da bolsa dela.
-Como assim?
-Calma, eu te conto, mas é claro deve manter segredo disso também.
Tsuyoshi contou toda a história para Kenichi, que só conseguiu comentar no final:
-É, Tsu, você realmente gosta dessa garota.
-Alias, ligue para nossos pais conforme disse que faria.
-Sim, sim! Eu ainda quero me encontrar com a irmã dela algumas vezes.
Tsuyoshi só gargalhou alto.
***
Todos os parentes ficaram em choque com a notícia da gravidez de Akemi.
Os  pais de Akemi viajariam para Tóquio no dia seguinte. A viagem não seria  tão longa, eles moravam no distrito Chubu, que é vizinho de Kanto, onde  fica a cidade.
Os  pais de Tsuyoshi também decidiram pelo dia seguinte, só demorariam um  pouco mais para chegar, eles moravam no distrito de Shikoku, que era bem  mais distante.
As  famílias se reuniriam no apartamento de Yoko e Akemi para um jantar,  onde eles conversariam sobre o assunto. Assim que os irmãos mais velhos  combinaram quando se encontraram de novo, ao pegarem as correspondências  no térreo.
***
No  dia seguinte na escola, Akemi conversava com Naomi na hora do almoço,  em um dos locais a céu aberto e distante dos outros alunos.
-Percebi que você e o Tsuyoshi-kun estão bem mais próximos. Aconteceu algo entre vocês?
-Nada. Só viemos e voltamos alguns dias para casa juntos, ele é meu vizinho, não tem nada de errado nisso.
-Ele não se declarou?
-Não, Naomi. Por que ele faria isso? - indagou já sabendo da resposta
-Aki-chan, não precisa mentir para a Naomi-chan. - o garoto chegou – Afinal, ela é a sua melhor amiga.
-O que está querendo dizer com isso, Tsu-kun?
-A Aki-chan está esperando um filho meu.
Akemi depressa, tampou a boca dele.
-Não fique dizendo essas coisas aos sete ventos, Tsuyoshi-kun. Alguém pode ouvir. Ainda nem sabemos se levarei isso até o fim.
-Você está mesmo grávida, Aki?
-Sim! - falou cabisbaixa
-E  não é seu Tsu-kun. - falou baixo – Porque eu sei que vocês não tem  nada. Sou a pessoa mais próxima de ambos. Alias, por que não me contou  logo, Aki?
-Eu fiquei com medo e o Tsuyoshi-kun descobriu antes que todo mundo. A história é extensa!
Os dois contaram a história a amiga.
-Quando os pais de vocês chegam?
-No máximo, amanhã.
-Boa  sorte! Apoiarei-os independente da decisão. Inclusive, - se levantou –  Tsu-kun, você pulou uma etapa do processo. Vou deixá-los sozinhos para  que ela se cumpra.
Era a declaração que o rapaz não tinha feito no dia que se encontraram no prédio, quando Akemi deixara o teste cair da bolsa.
-Essa Naomi-chan. - riu e sentou-se do lado dela.
-O que tem para me falar, Tsuyoshi-kun?
-Ore  wa... Ore wa... Suki dakara, Aki-chan. - Ela sorriu e se permitiu  chorar – E já tem bastante tempo. Foi por isso que eu fiz o que fiz  quando você chorou desesperadamente e sem um rumo a tomar.
-Tsuyoshi-kun...  - apertou as mãos na saia colegial – Eu espero poder corresponder os  seus sentimentos um dia. Eu também gosto de você, mas só como amigo. -  ela olhou para ele com vergonha – Desculpa! - abaixou a cabeça
O  garoto pegou na mão dela, essa atitude normalmente seria rejeitada, mas  com a confiança que conquistara com ela nos últimos dias, ela permitiu.
-Você só está sendo sincera comigo. Não precisa me pedir desculpas.
-Eu fico com um peso na consciência, porque você me ajudou tanto. Eu realmente queria retribuir o que está fazendo por mim.
Tsuyoshi se ajoelhou diante de Akemi, sem soltar a mão que segurava, e levantando o queixo, falou olhando nos olhos da menina.
-Não  quero que retribua. Eu estarei aqui com você, do seu lado. Estarei do  seu lado até o fim disso, seja ele um aborto ou um parto. Afinal, eu sou  o pai do seu filho, lembra?
-Sim, Tsuyoshi-kun. Você é!
Eles  se olharam, um sorrindo para o outro. Akemi sabia que poderia contar  mesmo com o Tsuyoshi para qualquer coisa. Ela achava que ele era muito  para ela e só conseguia pensar em como equivaler o que ele fazia por ela  naquele momento. Por enquanto, ela só se satisfazia em ter a companhia  dele.
Naomi assistiu a cena do segundo andar e não evitou de se emocionar também.
O  sinal tocou, indicando o final do horário de almoço. Tsu enxugou as  lágrimas de Aki e eles voltaram para a sala juntos. Os próximos dias dos  dois seriam bastante agitados.

Notas/Glossário:

1- A expressão significa “Prazer em te conhecer”, pelo menos nesse caso.

2- Haha: Mamãe

3- Chichi: Papai

4- Ore wa suki dakara: Eu te amo, no sentindo de apenas estar apaixonado.

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Capítulo 24 - Depressão

Passaram-se alguns dias e eu não tive tanto tempo para ler o diário. As coisas no escritório me deixavam cansado. Só tinha disposição para ler uma anotação por dia. Minha sorte é que elas eram bem pequenas.
Kazuko estava passando por um momento depressivo, ainda se mostrava muito abatida com a perda do bebê. Os dias dela já eram sempre os mesmos, depois do acontecido ela não tinha ânimo para nada. Ela se comportava bem diferente do que realmente é. Agora ela está brincando com o nosso filho e ele só sorrisos.
Tirei o diário da gaveta, sentei na cama e fui ler outra anotação.
Querido diário,
Os meus dias parecem cada vez mais arrastados. Os minutos e as horas passam muito mais devagar do que realmente eu sinto. Fico bastante tempo devaneando ou tentando me distrair, quando acho que se passaram horas foram apenas alguns minutos.
O que aconteceu alguns dias atrás ainda perturba a minha mente. O pesadelo e depois todo aquele acontecimento onde perdi o bebê. Makoto em momento algum me culpou ou me deu um sermão, dizendo que não me cuidei direito e contrariei as regras explícitas dele.
Ele também não tem me chamado para o quarto nos últimos dias. Nós mal temos conversado, só nos cumprimentamos.”
Eu sabia que ela precisava desse tempo, desse espaço. O baque que ela tomou foi bem mais forte que o meu. Afinal, foi ela quem engravidou e perdeu depois. Eu apenas assisti tudo. Não queria importuná-la fazendo-a ficar no quarto comigo. Era óbvio, por conta das circunstâncias, que era algo que ela não gostava.
Ela realmente precisava de um tempo, mas já começava a achar que era “tempo demais”.
Ele até pergunta como estou e eu respondo com um “Bem”. Monossilábico, seco e que acaba com qualquer possibilidade de continuar a conversa. Apenas assente e continua a comer.
Apesar de tudo, a Keiko ainda é uma ótima companhia. Com ela o tempo não é uma coisa amarga como quando estou tentando pegar no sono. Keiko consegue arrancar alguns sorrisos e risadas minhas, porém ela sabe bem o quanto estou abatida. Até tenta me animar, só não adianta muito.
E desta forma, como descrevi nos outros dias, meus dias se passaram.
Eu realmente estou em um momento depressivo e não tenho ideia de como sair.”
Eu já não aguentava mais vê-la dessa forma. Kazuko sempre foi sorridente e cheia de palavras. Mesmo sendo pobre e ter virado escrava, ainda encontrava maneiras de sorrir. Não suportava mais vê-la com aquela cara triste, se arrastando daquele jeito. Sentia saudade do sorriso e da risada dela, daquelas palavras animadas que dizia.
Agora ela ficava com aquela cara fechada, monossilábica e séria. E até eu estava começando a ficar mal com aquilo. Tinha que fazer algo antes que começasse mesmo a me afetar ou Kazuko tomasse uma medida drástica.
Com tudo isso, eu também perdi noção do tempo. Olhei o calendário e notei que meu aniversário de dezoito anos é daqui alguns dias. E pela primeira vez na minha vida não estou nem um pouco animada quanto a isso.
Meu aniversário sempre me foi motivo de alegria. Pessoas reunidas por minha causa, presentes e bastante comida. A única ocasião onde os pobres não tem miséria, porque sempre queremos que sejam coisas inesquecíveis. Um momento para esquecer a nossa vida ruim, mesmo que só um pouco. Mas, este ano, o que eu tenho a comemorar? Eu sou escrava e acabei de passar por uma situação horrível.
Gostaria muito de poder voltar no tempo e mudar o que aconteceu. Não o que aconteceu na semana passada, mas sim o que foi há quase seis meses. Queria de alguma forma impedir que Makoto viesse e me comprasse. Com certeza tudo seria diferente se aquele dia fosse diferente. Estaria animada como sempre fui e muito empolgada cursando a faculdade.
Eu queria passar o aniversário com a minha mãe e com as minhas amigas. Poder ficar jogando conversa fora, rindo de coisas bobas e esquecer dos problemas. E mais tarde, poder abrir os meus presentes e me sentir mais feliz ainda.
Pena que nunca acontece como queremos. Agora eu estou aqui presa. Tudo o que mais quero é minha liberdade, só isso! Voltar a ser aquela Kazuko feliz, sorridente e livre.
Infelizmente, nada disso depende de mim.”
Segui para a anotação seguinte, que diferente da que acabara de ler, era pequena.
Querido diário,
perdoe-me o desabafo ontem, estava precisando. É só com você que posso fazer este tipo de coisa. Só me sinto confortável aqui.
Meu dia de hoje foi como sempre, acordei, tomei café da manhã, ajudei Keiko nos serviços de casa... Uma coisa estranha é que Makoto chegou bem mais tarde do que o habitual. Ele disse a Keiko que acabou ficando um bocado ocupado no escritório. Eu não acreditei muito não! Não sei o porquê, mas eu senti que ele mentiu. Ele não aparentava cansaço como descreveu.
Aí tem algo!
Agora, eu dormirei.”
Neste e em mais alguns dias que se seguiram, eu cheguei um pouco mais tarde em casa. Justamente porque estava tomando uma atitude. Uma atitude pelo bem de Kazuko.
Ela iria ter um aniversário que nunca esqueceu.

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Capítulo 5 - Rosa venenosa

Amélia subiu e encontrou com Sarah, na sala. Ela imediatamente indagou:
–Amiga, com quem você estava lá me baixo? Eu vi em.
–Foi um amigo que eu encontrei no restaurante.
–Hum... E a entrevista? Conseguiu?
–Sim! Farei a matéria amanhã.
–Sério? O Marc é conhecido por ser tão fechado e até antipático.
–Eu tenho minhas manhas. - e riu – Vou tomar um banho para dormir.
Amélia deixou a bolsa no sofá e foi para o seu banho. Sarah mexeu na bolsa da amiga e acabou ouvindo toda a entrevista. Percebeu também que os dois já se conheciam. Ela decidiu comentar com Amélia apenas no dia seguinte, durante o café da manhã. E foi exatamente o que fez.
–Amélia, eu ouvi a gravação ontem. Você já conhecia o Marc antes?
A garota fez uma careta e respondeu:
–Conheço-o sim. Ele o tal “menino do karatê” que eu tanto falo.
–O quê? Então era ele com você ontem?
–Era ele sim!
–Ihh... Tá podendo em!
–Podendo nada! Ele é muito luxo para a minha carruagem, cara.
–Deixa disso. Ele tava te cantando na cara de pau ontem.
Amélia rubrou.
–E eu sei que você se fez de desentendida. - ela deu uma pausa – Quero que me conte a história toda.
Sarah deu carona a amiga até o trabalho, pois ela iri cobrir o treino de vôlei. Ela ouviu atentamente Amélia e comentou quando ela falou sobre o beijo antes da luta:
–Mentira! Amélia, nunca pensei que faria isso.
–Foi mais forte do que eu.
–E ele deu a resposta para o beijo ontem?
–É!
–Puta que pariu, um tempo do caralho. Ele gosta mesmo de você.
Amélia riu e concordou com a amiga. Sarah deixou-a no trabalho e partiu.
A jovem chegou e teve uma surpresa: um buquê de rosas vermelhas.
Todo mundo estava curioso para saber quem mandou aquilo para uma das novas funcionárias. O buquê estava em sua mesa e tinha um cartão. Amélia se sentou e leu o bilhete:
“Gostei muito do nosso reencontro ontem. E eu ainda me lembro que sua cor preferida é vermelho. Só não sei se rosas são as suas preferidas.
Podemos nos ver de novo? Te ligo mais tarde para saber.
Ass: Aquele menino do karatê”
–Então, de quem é? - perguntou uma das “vizinhas” dela
–Uma pessoa que reencontrei.
Só esta resposta foi motivo para a jovem garota ser o assunto do dia.
Imediatamente, Carmela chamou-a para sua sala. Ela queria saber novidades da “missão” que deu a garota.
–Sim, Sra. Carmela?
–Então, conseguiu a entrevista?
–Sim!
–Ótimo! Quero ouvir a gravação.
–Mas eu vou precisar dela para fazer a matéria.
–Ah, é verdade;
Amélia realmente precisaria da gravação para reproduzi-la na matéria com exatidão. Contudo, ela também não queria que descobrissem o seu passado com Marc.
Saiu da sala de Carmela e foi escrever a matéria. Antes do almoço ficou pronta. Mandou uma cópia para a chefe, que aprovou. Ela recebera um outro afazer para depois de comer: Fazer a página em que a entrevista apareceria.
Amélia desceu para almoçar e se encontrou com a amiga. Elas foram a um ótimo lugar.
–Como foi a cobertura, Sarah?
–Ocorreu tudo bem. Começar a edição hoje. E a sua?
–Estou construindo a página da revista. - fez uma careta – E você não sabe da novidade...
–Qual?
–Recebi um buquê de flores “daquele menino do karatê”.
–Mentira! Calúnia! E o que dizia?
–Ele quer me ver de novo e vai me ligar.
–Isso é ótimo, Amélia.
A garota deu um sorriso bobo só de se imaginar falando com ele ao telefone.
Sarah perguntou outra coisa:
–E o pessoal comentou alguma coisa?
–Não que eu tenha ouvido.
O resto do horário se passou com Sarah contando, detalhadamente, sua cobertura.
As amigas retornaram ao trabalho e chegaram um pouco mais cedo que os colegas e foram adiantando o que tinha a fazer. Sarah e Amélia podiam ouvir, pouco depois, os outros se aproximando e perceberam sobre o que conversavam: Amélia e o buquê que recebera.
–A garota mal chegou e já está ganhando flores, eu em! - falou uma
–Quero saber quem foi que mandou isso para ela. Ela não é isso tudo! - comentou outra
Elas fingiam não estar prestando atenção. Porém, uma troca de olhares e o gesto de Amélia, como se estivesse limpando algo que escorreu da boca bastou para entender: Olha o veneno escorrendo pelo canto da boca. Com outro olhar, Sarah riu e concordou.
Alguns minutos depois, o telefone de Ame´lia tocou. Ela sabia quem era mesmo que o número não estivesse em sua agenda. Foi a um lugar mais reservado para atender.
–Alô?
–Amélia, oi! É o Marc.
–Eu sei. Pressenti que era você.
–E também já sabe porque eu liguei. Quer jantar comigo hoje?
–Claro que sim! - respondeu sorrindo
–Eu te pego na sua casa. Tem problema?
–Não. Nenhum.
–Ok então. Deixa eu ir, tenho que treinar.
Amélia deu um risinho.
–Tchau!
–Tchau.
A jornalista voltou a sua mesa. Sarah perguntou:
–Quem era?
–Você sabe quem.
–Ah tá. - e riu
–Não se preocupe, ainda vou querer carona para casa.
E as amigas prosseguiram com o trabalho.
Marc treinava com Rafael e o Sensei. Ele aproveitou um intervalo para ligar para Amélia.
–Ligou para quem, Marc?
–Para “quem você não vai acreditar que eu reencontrei”.
–Amélia? - se meteu o Sensei
–Ela mesma!
Rafael fez uma careta de “eu não acredito”. O Sensei abriu um enorme sorriso. O treino durou mais algumas horas. Marc tomou uma ducha e foi para casa se trocar para poder buscar Amélia.
As amigas saíram do expediente e voltaram ao apartamento. Amélia se arrumou caprichadamente e ficou ansiosa esperando.
Meia hora depois o lutador ligou e disse que chegara. A garota se despediu da amiga, cheirou suas flores e desceu.
Marc a aguardava com um sorriso no rosto. Se cumprimentaram com um beijo.
–Eu não acredito que você ainda tem isso. - disse se referindo ao colar com pingente de luvas
–Ele é da sorte!
Entraram no carro.
–Para onde vamos?
–Vai reencontrar alguém que não vê há anos.

Capítulo 4 - A entrevista

A cena de Amélia segurando o soco de Marc foi fotografada por todos ao redor.
O lutador só conseguiu dizer:
–Amélia!
–Quanto tempo não?
–Sim. E o que a traz aqui?
–Bem, eu sou repórter da revista Super Sports. Você me concede a honra de entrevistá-lo?
Marc pensou rápido: “Ela só veio aqui para me entrevistar? Se eu disser não, ela vai embora”.
–Tudo bem. Pode ser agora. E eu pago o seu jantar.
–Não precisa disso.
–Ora, faço questão.
Marc seguiu seu caminho e Amélia foi atrás. O segurança, Erin, pediu desculpas ao garoto, que apenas respondeu:
–Não se preocupe! Ela é pequena e veloz. Você não a viu no meio dessa confusão.
Amélia pegou o seu cordão e escondeu-o por baixo da blusa.
Eles entraram no restaurante e Marc pediu mesa para dois, num lugar mais reservado. O pedido foi atendido. Sentaram-se e Amélia pegou o seu gravador e a folha com as perguntas.
O garçom veio anotar os pedidos. Marc pediu o seu preferido e a garota quis o mesmo. Então, o garçom saiu.
–Podemos começar? - disse Amélia, acionando o gravador
–Claro! Qual é a primeira pergunta?
–Hum... O que te inspirou a querer ser um lutador?
–Ora, o meu próprio pai. Desde que me entendo por mim, eu o vejo treinando. Se bem que agora ele ficou mais sedentário.
Ambos riram.
–E demorou muito para alcançar este sonho?
–Eu ainda não alcancei totalmente, mas já percorri boa parte do caminho.
–E quando vai completar?
–Quando conseguir um cinturão.
–Por que seu apelido é “Romano”?
–Sempre disseram que pareço com um, o apelido pegou na academia em que treinava e decidi adotar.
–Isto foi depois que eu sai?
–Foi.
–Ah, desculpe. Perdi o foco!
Marc sorriu e fez sinal para ela prosseguir.
–Conte um pouco da sua trajetória.
–Eu sempre treinei em pequenos lugares e com o meu pai. Por culpa dele tenho um salão só para isso na minha casa. Enfim, com 16 anos, entrei em um lugar e almejei o título de lá. Com ajuda de uma amiga, eu consegui, uma pena ela não ter visto a minha vitória. E o garoto que derrotei é meu amigo até hoje.
–Dessa parte não sabia.
A menina pediu desculpas de novo e foi a próxima pergunta.
–Até agora, você está invicto. Dizem que seu soco é indefendível. Acredita que isso seja verdade?
–Não. É a pior mentira que eu já ouvi. - direcionou o olhar para Amélia – Só existe uma pessoa capaz de defender meu soco e ela está bem na minha frente.
A repórter enrubreceu, abaixou a cabeça e comentou:
–Acho que não vou colocar essa parte.
–O que eu disse é mentira por acaso?
Marc esticou o braço e com a mão levantou o queixo de Amélia, fazendo-a olhar para ele.
–Eu só não acho pertinente.
–Não vou discutir. Só digo que todo mundo viu você segurando meu punho... Pode continuar. - voltou a posição que estava antes
–Posso fazer umas perguntas mais pessoais? Se incomoda?
–Nem um pouco.
–A sua família te apoia no que faz?
–Sim! Bem como disse antes, meu pai sempre me incentivou. A minha mãe é falecida, mas meu pai diz que ela teria orgulho de mim.
Amélia sorriu, meio sem graça com o que iria perguntar.
–E está solteiro, namorando...?
–Por que quer saber disso?
–O mundo quer saber.
–Estou solteiro. Pode parecer incrível, mas é isso mesmo.
–Imagino que não seja por falta de pretendente.
–Pois é, não me falta. Porém, eu dispenso todas, por conta de uma que eu não esqueci até hoje.
Amélia percebeu a indireta e se fez de sonsa. “Ele ainda gosta de mim”, pensou.
–Está apaixonado então?
–Sim!
E a comida deles finalmente chegou. Marc pediu um vinho, que logo foi servido.
Ao começarem a comer, ficou um silêncio que Marc teve que interromper:
–Continue.
–Ah, claro! Depois que ganhar o seu cinturão, vai ter algo mais a aspirar?
–Com certeza! Conseguir alguma coisa em outras ligas... Não sei. Só saberei quando chegar lá.
–Quer deixar alguma mensagem para os fãs?
–Eu tenho fãs? Até perco a noção disso. Só quero que continuem torcendo por mim e agradeço por tudo até agora.
–É isso então. Marc, agradeço pelo seu tempo e atenção.
–Você já vai?
–Não. Vou terminar de comer o jantar.
Eles riram. Marc disse:
–Pode apenas ser a Amélia agora?
–Claro, Marc.
A garota pegou o gravador e desligou-o. Continuaram a conversa:
–Agora eu quero saber o que aconteceu contigo. O que aconteceu na sua vida depois que me deixou daquele jeito. - falou cabisbaixo
–Eu terminei o ensino médio e fiz faculdade de jornalismo. Um mês atrás, fiz uma entrevista e fui chamada para trabalhar na revista. Comecei hoje.
–E a minha entrevista nessa história toda?
–Foi um desafio!
–Sua primeira reportagem? Que honra! - e riu
–É sim! E eu consegui uma coisa exclusiva.
–Convencida!
–Eu podia ter levado um soco.
–Desculpe, eu agi por instinto. Me assustei com o seu toque repentino.
–Minha sorte é que tenho reflexo.
Eles bateram um papo por um tempo, Amélia contou tudo o que fizera naqueles últimos anos e Marc também.
Ao saírem, os paparazzis ainda estavam lá e os seus flashes não paravam. Microfones se esticaram e perguntavam quem era aquela garota. O lutador apenas ignorou. Erin fez uma barreira para eles e Marc o deixou ir para casa em seguida.
Se dirigiram até o carro.
–Acho que eu vou daqui então. - disse ela
–Sozinha?
–É! Eu vim sozinha.
–Nada disso! Te dou uma carona.
–Não é necessário, Marc.
–Entra ou eu quebro seu gravador.
–Filho da puta! - reclamou ela com uma careta
–Não me xingue. - respondeu rindo
Entraram no carro e saíram.
–Ora, não fique com esta cara. Um reencontro destes, eu tenho que ser um cavalheiro.
Amélia sorriu.
Passaram o caminho conversando, a menina indicava o caminho. Demoraram um pouco para chegar. Marc parou o carro, desceu, abriu a porta para Amélia e ofereceu a mão para ajudá-la a sair.
–Nossa, eu não mereço tudo isso.
–Merece sim. Você é especial!
Amélia quase que se esconde de tanta vergonha. Ela deu um sorriso tímido.
–Ué, a luz do seu apartamento está acesa.
–A minha amiga deve estar acordada. Eu divido o apartamento com ela.
Mais um momento de silêncio, nenhum deles queria se despedir. Olhavam um para o outro. Marc acariciou o rosto de Amélia e indagou:
–Posso te dizer uma coisa?
–Fale, Marc.
–Eu fiquei desolado quando foi embora naquele dia, ainda mais depois do que fez ao se despedir de mim.
Amélia sabia bem do que se tratava.
–Eu agi sem pensar. Me culpo por isso até hoje.
–Não se martirize. Nada fez de errado.
Calaram-se novamente. A garota olhou as horas no relógio de pulso.
–Marc, já é tarde. Eu tenho que ir.
–Espera! - disse, segurando o braço dela.
Marc puxou Amélia para si e roubou um beijo dela. Essa era a sua resposta, anos atrasada. Foi um beijo calmo e muito carregado pelos sentimentos deles. Ao final, quando os lábios se separaram, Marc falou:
–Desculpe, eu agi sem pensar.
Amélia sorriu e beijou Marc.
–Promete que não vai me abandonar de novo? - ele questionou
–Eu prometo.
Ela iria subir, porém Marc a segurou outra vez. Tinha se esquecido.
–Pode me passar o seu telefone?
Ela abriu a bolsa, pegou um cartão de visita e entregou a ele.
–Qualquer coisa, sabe onde eu moro e trabalho.
Amélia subiu. Marc ficou ali alguns minutos, pensando no que acabara de acontecer.
Aquela cena do casal fora observada por Sarah, daquela janela com luz acesa.

Capítulo 3 - O reencontro

Marc continuou seus dias como o melhor da academia, sendo desafiado constantemente, como o anterior. Rafael e Marc tornaram-se amigos e dividiam momentos que antes eram dele com Amélia.
A menina entrou numa nova escola e começava a fazer novos amigos.
E sua promessa de manter contato? Ela não conseguiu. Tentou escrever uma mensagem para Marc, mas a cena do beijo e sua vergonha por aquilo persistia em sua mente. Toda dia tentava e exitava ao apertar o botão para enviar.
A mesma cena manteve-se fixa em Marc também. E a coragem também lhe faltara.
Um não se esqueceu do outro.
E o tempo passou. Marc e Amélia terminaram o ensino médio. A garota ingressou na faculdade de jornalismo e se formou. Marc dedicou-se a sua carreira de lutador e se tornou lutador profissional. E novas fases começavam na vida de ambos.
A menina estava de mudança, dessa vez porque queria e arrumara um emprego numa revista na antiga cidade em que morara. Ela e sua amiga Sarah dividiriam um apartamento. A amiga chegou como o carro para levar as coisas dela e de Amélia. Era hora de se despedir.
–Boa sorte, filha! - disse a mãe, abraçando-a apertado
Recebeu abraços do pai e do irmão também.
Eles ajudaram a guardar tudo no carro e as jovens meninas partiram.
Elas eram pura alegria no carro, o som estava bem alto. Sentiam o vento forte feito pela velocidade do carro, que era conversível. Elas conversaram:
–Finalmente saímos da asa de nossos país.
–Pois é! Esta é a primeira vez que me mudo porque eu quero. A última foi antes de te conhecer, amiga.
–Deve ter sido ruim trocar de repente de escola e de cidade. Eu lembro como era quando chegou.
–E foi muito duro para mim mesmo!
O rádio despertou a atenção de Amélia.
–Eu adoro essa música! E ela combina perfeitamente com este momento.
A música em questão era Freedom Dreamer de Minori Chihara. As duas cantaram com toda a energia de suas gargantas.
Everybody Jump! Everybody Jump! Motto toberu yo
Hateshinai We're Freedom Dreamer!”
E a viagem se seguiu animada dessa forma.
Marc entrou na liga de MMA. Passou anos em ligas menores, entrara nesta tinha uns dois meses e seguia invicto até então. Por conta disso, o garoto estava famoso. Muitos queriam entrevistá-lo e não conseguiam. Ele era muito reservado. Ninguém sabia nada sobre sua vida pessoal e nem do seu treinamento. Só se sabiam das vitórias e próximos adversários dele.
No mesmo dia da mudança de Amélia, Marc treinava, como todos os dias. E o seu fiel Sensei de karatê era o seu técnico. Ele não só sabia sobre karatê, sabia sobre outras artes marciais. E Marc praticou todas elas, como: Kung Fu, Muay Thai, Judô e Jiu Jitsu.
Todas estas artes eram uma vantagem para Marc.
E Rafael, ainda boxeador, treinava por lá também. Ele, descansando, puxou assunto enquanto Marc batia no saco de pancadas.
–Cara, quanto tempo mais vai ficar assim?
–Assim como?
–Sem se relacionar com ninguém. A imprensa acha que você é gay!
–Eu já te disse o porquê, Rafael.
–Já sei. Nunca encontrou nenhuma igual a Amélia. - e suspirou - Cara, você tem 21 anos e é virgem!
–O que há de errado com isso?
–Porque é por causa dela. Vai esperar reencontrá-la milagrosamente para sempre?
Marc parou de bater e se dirigiu a Rafael.
–Se necessário for, eu espero. Algo em mim diz que a verei de novo.
–Na boa, ás vezes, acho que você tinha que ter nascido mulher.
–Já chega disso! Cansei! Vou para casa.
Marc simplesmente pegou suas coisas e saiu.
Amélia e Sarah passaram o dia arrumando o apartamento. No final, ele ficou uma graça e bem com cara de menina.
–Nosso apartamento ficou uma graça, Amélia.
–Também acho, Sarah. - e se levantou - Essa arrumação me deu um calor!
–Que milagre é esse? Tirou o seu colar.
–É que eu vou tomar banho.
–Usa isso desde que eu a conheci. Quem te deu?
–Foi um amigo.
E o assunto acabou.
Mais tarde, na hora de dormir.
–Nem acredito que vamos começar a trabalhar amanhã.
–Nem eu, amiga.
E as jovens adormeceram.
Sarah também foi contratada pela revista. Ela fez o resto do ensino médio e a faculdade com Amélia. As duas eram melhores amigas.
No dia seguinte, elas acordaram cedo, se arrumaram e foram ao editorial da revista.
Ao chegarem, seus locais de trabalho foram apresentados. Em seguida, a chefe chamou-as para dar as boas-vindas.
–Bom dia, senhorita Sarah e senhorita Amélia. Eu sou a Sra. Carmela e desejo-lhes boas vindas ao editorial da revista Super Sports.
Então, ela deu um desafio de campo para cada uma das novas funcionárias. Sarah iria cobrir um treino de um time de vôlei, cujo desafio mesmo seria entrar, pois era um treino fechado. Sarah saiu para sua missão, deixando Amélia e Carmela sozinhas.
Enquanto ao desafio de Amélia...
–E o meu desafio, Sra. Carmela?
–Deixe-me ver... Você gosta de artes marciais né?
–Sim!
–Hum... Tem uma coisa que eu quero que alguém faça para mim. - deu uma pausa – Entrevistar o promissor lutador: Marc “Romano”.
Romano era o “apelido de lutador” de Marc.
A reação de Amélia foi imediata:
–O quê?
–O que eu disse: Entrevistar o Marc. Acha que não consegue?
–Não é isso! - gaguejou, ela não poderia falar – Não é nada! É que ele mesmo expulsa a pontapés.
–Mas você é bonita e da idade dele. Acha que ele não vai querer conversar com você?
Amélia não respondeu, apenas aceitou e voltou ao seu lugar. Sarah, que foi colocada ao lado da amiga, perguntou:
–E então, qual é o seu desafio?
–Você não vai acreditar!
–E o que é?
Nesse momento, todo o editorial parou para prestar atenção.
–Entrevistar o Marc “Romano”.
–Caramba! Isso é uma coisa totalmente nova e desafiadora.
–Eu sei!
O resto do dia passou normalmente. Amélia recebeu da chefe a informação de que Marc jantaria em seu restaurante preferido naquela noite. E passou o nome do tal lugar.
A jovem passou o seu dia nervosa, seu coração estava atônito. Contudo, não era medo de não conseguir cumprir o desafio, era o medo de ver Marc depois de tudo o que aconteceu. Todos os sentimentos do passado retornaram.
Sarah notou a mudança na amiga, quando, ao chegarem no apartamento, Amélia tomou um banho e iria sair sem colocar o seu cordão com pingente de luvas, o seu favorito e da sorte.
–Amiga, está tudo bem?
–Sim, Sarah. Eu já vou sair.
–Não esqueceu nada?
–Não!
–Então, por que o seu cordão favorito e da sorte está aqui? - falou mostrando-o em sua mão
–Só não quero usá-lo agora.
–O que há de errado com você?
Amélia ficou vermelha.
–Está nervosa por culpa da entrevista né?
Ela assentiu, mentindo.
–Não precisa ficar assim. Ganbatte kudasai nee, Amélia-chan! - falou sorridente
Sarah colocou o colar na amiga. Amélia saiu e pegou um táxi com destino ao Thé Fleur de Lune, restaurante preferido de Marc.
O jovem passou por mais um dia de treino e com Rafael no seu pé. Voltara para casa e tomara um banho. Pegou o seu carro e dirigiu ao restaurante, junto com o seu guarda-costas, no banco do carona. E, como sempre, dirigia com aquela garota na cabeça. Sentia saudade dela, de poder lutar, conversar, sair e se divertir com ela.
Amélia viajava quieta e pensativa, tentando tomar coragem para o que teria que fazer. Pois é, ela estava com 21 anos, fazia uns cinco que não via Marc. Se despedira dele de um jeito a deixar segundas intenções e ele poderia querê-las agora. Ela desejava e ao mesmo tempo não desejava revê-lo. Um era amor e o outro medo. E agora, teria que enfrentar o segundo por imposição do trabalho.
O lutador estacionou o carro ali perto e ia até a entrada do restaurante a pé, na companhia de seu guarda-costas. Era só com ele que Marc contava para se defender, além dele mesmo. Se ele não segurasse, Marc se encarregava por si.
Amélia pagou o táxi, agradeceu ao motorista e desceu. Até esta altura, Marc já se aproximava da entrada e estava rodeado de repórteres e paparazzis. A garota olhou para o lado, viu a confusão e depois, Marc. O coração falhou uma batida, o nervosismo tomou-a, uma vontade a fez correr. Entrou na bagunça, passou por todos e consegui tocar no ombro dele.
O toque fez o instinto de defesa dele se ativar. Marc virou o corpo, com o punho fechado. Amélia agarrou o soco. O olhar dele se arregalou, impressionado. A garota falou:
–Você ainda começa com a direita!

Capítulo 2 - O melhor da academia

Dois meses se passaram desde a primeira vitória de Amélia. Ela melhorava cada dia mais e perder deixou de ser parte de sua rotina.
Marc continuava seu treinamento para ser o melhor da academia, com ajuda de Amélia. Agora, ela era uma adversária e tanto. O senso de observação, cujo ele ensinara a menina, se mostrava contra ele. Em um dos treinos, na casa de Marc, ela segurou o soco dele. Aquilo era meio impossível, devido a velocidade, até para o professor de karatê. Chocado, falou:
Como fez isso?
–Você sempre começa com a direita.
Marc, totalmente revoltado, continuou a sequência de golpes. Tudo foi seguido narrado pela voz de Amélia, enquanto defendia:
–Esquerda, direita, chute baixo, direita, direita de novo, chute alto. – deu um passo para trás – Opa! Esquerda, esquerda e direita.
–Eu não deveria ter te ensinado isso. - disse rindo
–Impressionado?
–Totalmente.
Amélia não conteve o riso, por causa da expressão que Marc fizera.
O garoto já se preparava para desafiar o melhor da academia e fazer do duelo deles um grande evento. Pedira para sua parceira, Amélia, espioná-lo. Ela descobriu muito sobre ele. Se chamava Rafael e era boxeador. Estava em seu posto há dois anos e recebera muitos desafios, porém ninguém fora capaz de derrotá-lo.
Apesar da enorme fama e favoritismo de Rafael, Marc estava determinado a quebrar isso.
Mas, algumas coisas teriam de ser feitas antes de Marc fazer o desafio frente a frente a Rafael. Foi, então, falar com o professor de karatê.
–Professor, posso falar com você?
–Claro! Vamos ali, para termos mais privacidade.
Dirigiram-se ao local indicado.
–Fale.
–É que... Bem, eu quero desafiar o Rafael pelo título da academia.
–Hum... E quer minha ajuda?
–Exatamente.
–Amélia. - a menina olhou – Venha aqui! - disse fazendo o gesto com a mão.
–Diga, professor.
–Acho que vamos precisar da sua ajuda para sondar e observar o Rafael.
–Eu já até sei o motivo. Não será necessário explicar. - comentou Amélia
O professor esclareceu todos os pontos aos jovens alunos. Falou um pouco o que sabia sobre o boxeador. A garota deu um jeito de descobrir quais eram os dias que Rafael estava na academia.
Alguns dias se passaram. Marc e Amélia marcaram de comparecer a academia para o garoto fazer o desafio. Ele pedira a menina para acompanhá-lo, apenas para ter um apoio moral.
Ao entrarem, todos pararam para observá-los, principalmente o rapaz. Rafael estava no saco de pancadas, Marc aproximou-se dele e falou:
–Rafael, posso falar com você?
–Claro. Mas, primeiro, quem é você?
–Sou Marc, faço karatê aqui.
–Hum... O que quer comigo? - perguntou Rafael, já pressentindo algo
–Eu te desafio a uma luta. Pelo título de “melhor da academia”. Aceita?
–Sim. Vai ser divertido!
Um aperto de mão selou tudo.
Então os dois karatecas saíram Cada um foi para sua respectiva casa.
Amélia chegou ao lar e percebeu que seu pai encontrava-se muito feliz e reuniu a família para contar uma novidade.
–Filhos, querida, tenho uma boa notícia.
–Diga, pai. - falou o irmão de Amélia
–Fui promovido!
–Isso é ótimo! - exclamou a esposa
–Ganharei o dobro, mas... Teremos que nos mudar para outra cidade.
–O quê?! - gritou Amélia – E nossa vida aqui?
–Ora, vai ficar por aqui.
–De novo não é, papai? Serei a novata da escola de novo. Legal!
Eles já passaram por situações de mudanças pelo menos umas três vezes; E a garota demora a se acostumar aos novos lugares.
–E alias, Amélia, não vai mais fazer essa coisa de luta. Não é coisa de menina e também não gosto daquele garoto que anda com você.
–O Marc? Você não o conhece, pai.
–E nem preciso. Estamos de mudança.
–Que raiva que eu tenho disso. Quando eu tiver minha vida... Ah...
Amélia saiu rápido da sala e bateu a porta do quarto. Ela afundou o choro no travesseiro, por dois motivos: Passaria por outra mudança; Por causa de Marc, tanto pelo que o seu pai disse, como o que sentia por ele.
Teria que tomar uma coragem tamanha para lhe dizer. Mas de quê adiantaria? A distância viria mais rápido do que pensasse. Ainda havia a reprovação do pai.
Amélia decidiu manter a sua mudança em segredo do amigo, para não preocupá-lo. E se concentrou em ajudá-lo no seu objetivo: Ser o melhor da academia.
A pedido de Marc, Amélia, disfarçada, fora até a academia com uma câmera para filmar o adversário dele treinando. Com isso, fariam um mapeamento completo do seu estilo. Uma vantagem para Marc.
Mais dias se passavam e a grande luta se aproximava. Era mais uma das tardes em que Marc e Amélia treinavam juntos. E naquele dia ele ensinava a ela alguns modos de derrubada. Marc fazia os movimentos e Amélia era a cobaia. O seu lado infantil gostava de girar, indo de um lado a outro e caindo.
Em um destes, Marc perdeu o equilíbrio e caiu em cima de Amélia. O corações de ambos aceleraram pela proximidade dos rostos. Os olhares se cruzaram, a menina sorriu. Os rostos se aproximaram mais, os lábios quase se tocando... O pai de Marc apareceu e os interrompeu.
–Filho, telefone para você.
Ele ajudou Amélia a se levantar e foi atender o telefonema. Quando Marc terminou, Amélia foi para casa, tinha que arrumar a mudança. Ambos estavam sem graça com o que acontecera. Ralph falou com o filho:
–Quase que beijou a Amélia hoje em. Gosta dela não é?
–Gosto. E agradeço por ter me interrompido. - disse ironicamente
–Acho que eu sou adivinha é?
E os dois riram. E depois, o pai comentou:
–Eu gosto da Amélia e acho que vocês formariam um belo casal.
–Obrigado, pai.
–Só digo a verdade.
Amélia chegou a sua casa.
–Filha, precisa arrumar suas caixas depressa. Mas mudamos semana que vem.
–Como é? Mas... Semana que vem é... A luta de Marc.
–Não interessa.
A menina sabia que não poderia reclamar.
–Tudo bem, pai.
E foi ao quarto, entristecida, arrumar as coisas.
A partir daquele dia, faltavam sete dias para a luta pelo título da academia. Os dois garotos treinavam a todo punho. Rafael estava confiante e tinha certeza de que ganharia. Afinal, ela era forte e musculoso. Seu adversário aparentava ser bem fraquinho. Marc prometera se esforçar para vencer a luta honestamente e ele não desonraria seu inimigo.
E finalmente chegou o dia! Dia da grande luta e da mudança de Amélia.
Os dois garotos decidiram descansar durante o dia para guardar energia e queimá-la a noite.
Amélia passou o dia fechando caixas e empacotando coisas. Terminaram tudo próximo ao horário da luta. Não demoraria muito para que fossem embora. Amélia queria falar com Marc antes da luta, se despedir dele, desejar-lhe boa sorte. Saiu de casa e foi correndo a academia.
Marc estava no vestiário, havia se trocado e esperava lhe chamarem. Ele estava nervoso, pela luta em si e por não ter visto Amélia aquele dia. Ele queria que ela participasse disso com ele. O professor de karatê apareceu.
–Marc, como está? Está nervoso?
–Um pouco. Rafael é muito bom!
–Modéstia a parte, acho você bem melhor.
O garoto sorriu. O professor desejou-lhe boa sorte e saiu.
Em seguida, Amélia chegou e viu a academia lotada. Realmente muitos vieram para ver. Ela encontrou o professor, cumprimentou-o e logo perguntou onde Marc estava. Ele indicou e a menina correu para lá, já que não tinha muito tempo. Abriu a porta, Marc estava de costas e ao vê-la entrar, se virou e falou:
–Pensei que não viria.
–Fiquei ocupada o dia inteiro. - disse mordendo os lábios
Marc percebera que havia algo errado.
–Aconteceu alguma coisa?
Amélia sabia que não poderia mentir.
–Eu só vim aqui para desejar boa sorte. E me despedir.
–Despedir?
–É! Eu não te contei, hoje eu vou me mudar para outra cidade. Não disse porque não queria te preocupar.
Marc ficou estático e demorou a responder.
–Então é isso mesmo? Vai largar tudo? Por que vai se mudar?
–Meu pai foi promovido.
–Entendo! - falou ele ficando triste, sentindo o coração apertar.
Amélia se aproximou dele. Colocou a mão no rosto de Marc, ele pôs a dele por cima.
–Manteremos contato. - disse ela sorrindo
Se olhares cruzaram-se novamente. A menina foi tomada por uma vontade do seu âmago. Nem pensou, apenas beijou Marc. Um beijo apaixonado e triste, por conta do clima de despedida.
Quando o beijo terminou, Amélia, caída em si, enrubreceu. Num sussurro, completou:
–Boa sorte, Marc.
Então, ela saiu. O coração de Marc estava confuso e totalmente fora de ritmo. Decidiu se concentrar em ganhar sua luta por Amélia.
Amélia saiu sentindo o peito pulando e um pouco ofegante. “Mas o que eu fiz?”, pensou. Ela sabia o porquê fizera, mas não queria admitir.
Aquele momentos se manteria na mente de ambos por um longo tempo.
A garota retornou a casa e logo a família partiu com a mudança. Em sua cabeça só tinha uma coisa: Marc.
O garoto logo foi chamado para a arena. Como o desafiado fora Rafael, ele escolheu o ringue de boxe para a luta; Marc não ligava para o lugar, desde que pudesse bater.
Os lutadores subiram, foram apresentados e logo começaria a luta. O professor de karatê apenas falou para Marc:
–Faça o seu melhor, sei que consegue e boa sorte!
Os dois jovens foram ao centro do ringue, se cumprimentaram. Rafael ironizou:
–Não vai colocar suas luvas?
–Eu não preciso.
O juiz deu o “valendo” e o sinal tocou.
Ambos armaram suas guardas e começaram a se encarar. Rafael deu uma sequência de socos, porém Marc desviou de todos. Rapidamente, contra-atacou e acertou uma belo golpe no rosto do adversário, que fez Rafael ter a cabeça jogada para trás.
Ele voltou da vertigem logo e continuou os seus ataques. A velocidade de Marc auxilou-o a desviar novamente. Rafael se irritou com aquilo e prosseguiu golpeando, cada vez mais rápido. Então, Marc finalmente recebeu alguns socos no rosto e barriga.
Pulou para trás para desviar da ferocidade de Rafael e dar uma respirada. Sentiu as dores e voltou ao combate. Marc quem realizou o próximo ataque. O combo que Amélia defendera facilmente, entrou no corpo de Rafael. Os dois chutes que causaram o maior dano.
Marc não deu tempo para o adversário recuperar o fôlego. Uma sequência de diversos chutes se seguiu. E afetou drasticamente Rafael. O boxeador ficou totalmente tonto e desnorteado. Marc apenas encerrou a luta com um outro chute em sua nuca, nocauteando-o. Toda a plateia vibrou, principalmente o pai de Marc.
Quando Rafael acordou, foram declarar o vencedor. O juiz chamou os dois ao meio do ringue. Levantou o braço de Marc e o anunciou como o novo melhor da academia.
Respeitosamente, ele abraçou Rafael e agradeceu pela luta. Ele retribuiu e se sentiu honrado por ter perdido seu título para um ótimo lutador.
–Eu posso treinar com você, cara? - perguntou Rafael
–Claro! Vamos trocar nossos ensinamentos. - respondeu sorrindo
Depois de tudo, no caminho de casa, Ralph indagou ao filho:
–E Amélia? Não a vi.
–Ela foi falar comigo enquanto estava no vestiário. Ela estava de mudança.
–Assim de repente?
–Já fazia um tempo, mas só me contou hoje. - Ele suspirou – E tem mais: Ela me beijou.
O pai deu uma risada de “Eu sabia!”.
–Espero que ela mantenha contato como prometeu.
–Eu também, filho. Eu também.

Capítulo 1 - Aluno novo

Amélia chegou a academia para mais uma aula de karatê. Fazia pouco mais de um ano que a garota de 16 anos ia para lá dois dias na semana.
Ela não era muito boa. Nos treinos em dupla ou em grupo, ela realizava tudo corretamente. Porém, quando ela ia para um combate era uma negação. Não conseguia fazer nada. Sempre perdia!
E por conta de tudo isso, ela era a pior aluna. E também a que mais sofria bullying. Amélia não ligava, se divertia bastante nas aulas.
E neste dia havia um rosto novo, um novo aluno. Ele se apresentou devidamente em frente a turma. Seu nome? Marc. As meninas logo ficaram loucas por ele, assim como eram por todos os outros.
E era hora de formar as duplas para treinar. Como sempre, todos se juntando e Amélia ficava de lado. Talvez fosse assistente do professor de novo.
Muitos queriam ser a dupla de Marc. Ele recusou todas as propostas, a maioria de garotas. Ele vasculhava o tatame a busca de alguém. E encontrou! Se dirigiu a menina isolada no canto:
–Olá! Eu já me apresentei lá na frente, mas eu sou Marc.
–Eu sou Amélia. Prazer! - disse envergonhada
–Ninguém veio falar com você. - Ele perceber que ela era excluída - Quer ser minha dupla hoje?
–Claro! - respondeu mais sorridente e radiante do que nunca
Os dois foram mais ao centro. Os olhares se dirigiam a Amélia.
“O que esse garoto tem na cabeça?”, pensou um.
O professor brincou com ela:
–Ora, Amélia, alguém escolheu você. Perdi a minha assistente hoje. - olhou para Marc – Se deu bem né? Essa menina é boa!
Marc não evitou de questionar:
–Por que não fazem dupla com você?
–É que o pessoal aqui não gosta muito de mim. - Ela foi sincera – Me rejeitam, porque eu não sou boa em combate.
–Não tem nada de errado nisso. Nada que um pouco de treinamento não resolva.
Amélia sorriu para ele, como era simpático.
Em seguida, o professor iniciou a aula. Este exercício era para conhecerem e fazerem alguns golpes.
Amélia ajudava bastante Marc quanto a posição ou o jeito de chutar, entre outras coisas.
Terminada esta parte, vez das lutas e as duplas foram mantidas para tal. E lá foi Marc contra Amélia. O garoto estava um pouco receoso, ela era menina. O professor disse que não havia problema. Mas o seu cavalheirismo mandou maneirar um pouco.
A luta entre eles começou e nem demorou a acabar. Amélia tentou dar um soco e mais outro, mas Marc deu-lhe um chute e mantendo a rotação do corpo acertou mais um. Só se viu a garota se distanciando e parando perto da ponta da arena.
Imediatamente vendo o que fez, correu para a acudi-la. O professor foi também. Por sorte, ela estavam bem, apenas dolorida com a queda.
Marc pediu um zilhão de desculpas a ela.
Mais alguns dias de aula se passaram. Marc fazia dupla com Amélia. E depois aconteciam as lutas, algumas foram com ele, outras não. Ele sempre observava a menina e começara a montar o perfil de lutadora dela.
Amélia era excelente na teoria. A prática que ela não era boa. Marc viu que ela não tinha tempo de reação rápida. Já ele, que conseguia olhar para si, era o contrário dela.
Ocorrida a última aula da semana, o garoto pensou e pensou... Como ajudar Amélia? E na semana seguinte, ao final, abordou-a:
–Amélia, posso te perguntar uma coisa?
–Diga, Marc! O que?
–Podemos treinar juntos?
Se fosse outro, falaria gaguejando e ficando totalmente rubro. Contudo, Marc era determinado.
–Como assim?
–Na minha casa, tem uma sala que meu pai fez para mim. Eu posso te ajudar com o combate e você me auxilia com as posturas. Que tal?
Um sorriso se formou no rosto da jovem.
–Eu treino com você sim! Vai ser divertido.
Marcaram de começar no dia seguinte. Marc passou o endereço a ela. No dia marcado, a tarde, Amélia bateu a porta dele. Um senhor atendeu:
–Boa tarde, mocinha!
–Boa tarde! Aqui é a casa do Marc?
–Sim. Mas a pergunta é o que quer com meu filho?
–É que eu vim aqui para treinarmos karatê juntos.
–Ah, ele me falou de ti. Amélia, não é?
–Sim!
–Eu sou Ralph, pai de Marc. Ele está no salão de treino dele. Eu te levo lá!
Amélia acompanhou Ralph. Marc, que estava todo suado, já que golpeava o saco de pancadas, cumprimentou-a:
–Amélia, que bom que chegou.
Ele viu que tinha alguma coisa diferente nela, havia algo pendurado em seu nariz.
–Não sabia que usava óculos.
–Ah, é que nas aulas eu coloco as lentes de contato.
–Fica bem melhor com os óculos.
–Obrigada! - falou timidamente e ajeitando a armação com o dedo.
A jovem trocou de roupa e eles começaram a treinar.
Assim eles fizeram ao correr dos dias. Divertiam-se e aprendiam. Conheciam-se mais ao conversar durante os intervalos. Mantinham-se juntos nas aulas de karatê. Cada dia mais próximos e a amizade entre eles surgiu. Os treinos deixaram de ser os únicos momentos em que se viam. Passaram a sair para o shopping ou cinema de vez em quando. Quem via aqueles dois, percebia que algo novo aparecia. Todos enxergavam, exceto os próprios.
Marc se mostrou um menino simpático, determinado, excêntrico e companheiro.
Amélia revelou-se tímida, bem fechada em seu mundo, boa ouvinte e amiga.
Eram bem diferentes um do outro, mas se atraíram, por ter um ponto em comum: a luta.
E os treinos que eles mantinham já estavam dando resultados. Amélia raramente pedia para Marc consertar suas posturas. A menina por trás daquelas lentes passara a observar melhor seus adversários, achar e utilizar seus pontos fracos a seu favor.
Essa evolução apresentou sua efetividade em uma das aulas, na parte do combate.
Amélia foi contra outra garota, que era razoavelmente melhor do que ela. Parecia mais uma daquelas batalhas rotineiras em que a excluída perde e vira motivo de risada dos outros. Contudo, agora ela estudava todas as movimentações dos vários alunos. Sabia, tinha previsão do que ia acontecer.
Sua adversária avançou sobre ela, com a mesma sequência de ataques com a qual começa. Amélia, se aproveitando isso, desviou de todos os socos. Quando a outra abriu a guarda, foi sem pena em seus golpes. Por pouco a garota não desmaia.
O professor ficou muito feliz de, pela primeira vez, declarar Amélia vencedora. O resto da turma aplaudiu. Amélia ajudou a outra a se levantar. Foi falar com Marc em seguida. Ela recebeu um abraço forte e um “parabéns” da parte dele.
No dia seguinte, Marc e Amélia estavam passeando, distraídos, olhando as vitrines. Em uma loja de joias e bijuterias, os olhos da menina bateram em um cordão com um pingente que era luvas. Não evitou de dizer:
–Nossa, que lindo!
–Quer para você? - Ele perguntou de repente
–Ah, não precisa, Marc.
Ele viu o brilho no olhar dela. Sem nada dizer, puxou-a para dentro da loja. Pediu o colar ao vendedor, que trouxe e mostrou. Amélia não perdia o encanto pelo objeto, apesar de falar umas dez vezes que não era necessário. Ao ouvir o preço, ela se surpreendeu.
–É muito caro! Marc, não precisa. É sério!
Claro que o menino ignorava os protestos dela. Daria aquilo como um presente. Comprou, agradeceu ao vendedor e saiu. Amélia estava irritada com a teimosia dele. Marc retirou o colar da caixa e falou:
–Deixa eu colocar em você.
Ela apenas virou-se de costas e segurou o cabelo. Ele pôs o cordão nela, que indagou:
–Por que me comprou isso?
–É um presente! Pela sua primeira vitória ontem.
Ambos sorriram e sentiram seus corações acelerarem neste momento. Amélia, completamente envergonhada, disse “Obrigada!”.
–Só não se acostume com tantos presentes. - foi o que Marc respondeu.
A noite, antes de dormir, os pensamentos dos dois foram povoados pelo outro. Então, perceberam o que sentiam.

sexta-feira, 27 de março de 2015

Capítulo 23 - Grande Trauma

Só pude ler novamente quando voltei do trabalho. Troquei de roupa, peguei o diário e me sentei no sofá. Li uma anotação bem semelhante à do dia anterior. Quando acabei, Kazuko se sentou ao meu lado e ligou a TV.
-Que parte você está lendo? - disse espiando – Ah, essa parte. Eu não gosto muito de lembrar desse dia.
Sabia bem a que dia ela se referia, pois eu dei uma espiada em algumas linhas lá embaixo. Comecei da linha seguinte.
Diário,
Eu nem sei nem por onde começar a dizer tudo o que aconteceu ontem à noite. As lágrimas e a culpa não saem de mim.
Tive um dia bem normal e estava me sentindo ótima. Eu adormeci rápido a noite e foi então que este pesadelo começou. Na verdade, no início parecia um sonho como qualquer outro.
Colocava o bebê para dormir, carregava-o em meus braços. Os olhinhos dele abriam e fechavam, até finalmente dormiu. Observei seu rosto sereno e uma coisa estranha aconteceu. Uma brisa soprou atrás de nós e o bebê começou a se desfazer, como se fosse areia.
Assustei-me e perplexa, o vi sumir diante de mim. E não pude fazer nada. Tentei gritar no sonho, mas aconteceu de eu acordar gritando. Foi tão forte que me secou a garganta. Makoto levantou num pulo e perguntou:
-Kazuko, o que houve? - então acendeu o abajur e pude ver uma expressão de aflição em seu rosto quanto olhou em direção as cobertas.
Foi aí que eu senti e vi. Uma sensação idêntica a quando minhas regras vêm e sangue. Apesar da pouca luz dava para ver, nitidamente, que era sangue, os lençóis são claros.
O desespero veio, uma grande dor também e só consegui chorar. Makoto me chamou e falou, segurando em meus ombros:
-Temos que ir ao hospital agora. Se troque depressa e vamos.
Fiz conforme ele mandou. Coloquei um vestido simples e saímos. As lágrimas e nem a dor não paravam. Ele parou o carro, levantou me rosto e me disse:
-Kazuko, tá tudo bem!
Assenti concordando e seguimos.”
Eu não queria pensar no pior nesse momento. Tinha esperanças de que ela não abortara. Também estava desesperado e nervoso, porém eu tinha que mostrar segurança e apoiar Kazuko.
Por sorte, Rin estava no hospital, pois uma de suas pacientes encontrava-se em trabalho de parto. Durante a triagem, eles a chamaram para me atender.
-Boa noite, Kazuko, Makoto!
-Boa noite! - respondemos em uníssono
-E o que aconteceu? - indagou Rin, próxima de mim e me olhando
-Ela teve um sangramento.
-Muito sangue? Pouco sangue?
-Bom, o lençol ficou razoavelmente sujo.
-Ok! Vamos ter que ir a máquina de ultrassom para ver se está tudo bem.
Fizemos conforme ela disse.
Eu me deitei na maca e ela pôs aquilo na minha vagina. Mexeu por um tempo e pude pressentir pelo olhar dela que vinha uma má notícia. Não tive coragem de perguntar, quem o fez foi Makoto:
-E então?
-Eu lamento. - ela virou-se para ele – Kazuko sofreu um aborto.
A única coisa que consegui fazer foi chorar, apenas uma lágrima solitária caiu. Rin discursou o resto dos procedimentos:
-Kazuko, vou te colocar em observação até amanhã. Vamos ver se vai sair alguma coisa, caso não mandarei fazer a curetagem para tirar o que ainda estiver dentro de você e também para estancar esse sangramento. Com licença! - e saiu
Então desabei de novo. Makoto estava parado ao meu lado. Seu olhar parecia perdido e triste.”
Eu ainda estava em choque com a notícia repentina. Não sabia como reagir, só não queria era chorar diante dela.
-Makoto! - chamei-o tocando em sua mão
-Oi, Kazuko. - falou sentando-se na maca e olhando para mim
-Me desculpa.
-Pelo quê?
-Por ter perdido o bebê.
-Kazuko, já te disse que está tudo bem. - apertou a minha mão – Estamos juntos nisso, lembra? - assenti – Então, não fiquei assim.
-Tentarei fazer o meu melhor. - sorri um pouco
-Sendo assim está bom.
E não falamos mais nada. Ficamos nos olhando, um clima meio desconfortável até chegarem para me levar ao quarto. Makoto me acompanhou até lá. Fiquei algumas horas em observação e nada aconteceu. Acabaram me levando para fazer a curetagem. Ele não pode ir comigo.”
Vi Kazuko sendo levada na maca. Eu sai dali e fui ao banheiro, era o único lugar onde poderia ficar sozinho.
Adentrei em um dos boxes e, fora do meu controle, as lágrimas caíram em silêncio. Todo o choro que segurei na frente dela caiu naquele momento.
Também fiquei triste por ela ter perdido o bebê. Assim como ela, já estava imaginando a vida com ele. Nós dois ainda estávamos assimilando e acostumando a ideia de termos um filho juntos. Foi um choque ao descobrir e outro choque ao perder.
Todos esses sentimentos escorriam por meus olhos. Com certeza, isso foi um grande trauma para mim e para Kazuko.
Levaram-me para uma espécie de sala de cirurgia e a própria Rin estava lá me esperando. Ela veio me explicar o que faria:
-Kazuko, eu vou te anestesiar. Vai dormir uma meia hora. Talvez acorde um pouco dolorida, mas isso é normal. Alguma pergunta?
-Eu vou para o quarto depois disso?
-Sim!
Então, ela me deu a anestesia e eu apaguei.
Quando dei por mim já estava no quarto. Makoto e Rin conversavam, mas só ouvi uma fala da conversa:
-Quando a menstruação dela voltar, podemos retornar com o anticoncepcional.
Rin saiu.
-Parece que acordou. - falou ele – Como se sente?
-Bem, apesar de meio sonolenta.
Ele se sentou na cama e eu perguntei:
-O que a Rin tava falando com você?
-Sobre o que aconteceu. Ela me disse que o bebê ainda estava dentro de você. Só que ele descolou na parede e foi parar no colo do seu útero.
-Por isso eu sangrei daquele jeito.
-É! Foi!
-Ela disse em quanto tempo eu posso me recuperar?
-Entre dois ou três meses.
Ele baixou o olhar e ficou acariciando a minha mão.
-Makoto, - soltei, ele levantou a face – se quiser, podemos tentar de novo.
Por que eu falei isso?
-Não precisa, Kazuko. Lembra que eu não quero filhos agora?
-Lembro sim. Mas, eu pensei que tivesse mudado de vontade.
-Eu só me conformei com o houve. Aceitei a ideia de ter um filho.
-Eu também, Makoto.
-É melhor descansar, teve uma noite cansativa.
-Cansativa? Acabei de acordar de um cochilo.
Foi só nesse momento que eu notei, Makoto estava com os olhos vermelhos e visualmente abatido. Não aparentava mesmo estar conformado com o ocorrido. Parecia que também havia chorado.
-E esses olhos vermelhos? - indaguei
-É só sono, só isso.
-Melhor descansar um pouco. - olhei as horas no relógio – E o seu trabalho?
-Eu falo com o meu chefe, você sabe que ele é bem compreensivo.
Apenas concordei. Makoto saiu em seguida e o ainda efeito da anestesia me fez dormir de novo.”
Eu liguei pro meu chefe na hora que costumo sair de casa para trabalhar e lhe contei toda a história. Ele se mostrou triste por mim, afinal, ele já passou por isso também.
Acordei porque o Sol me incomodava. Ele já estava razoavelmente alto no céu, pelo que percebia. Cobri parte do rosto com a mão e olhei para o sofá ali perto. Makoto dormia sentado, com uma postura firme e braços cruzados.
A enfermeira entrou no quarto trazendo meu café da manhã. Sua voz acabou despertando Makoto abruptamente.
-Bom dia, Srta. Hirasawa.
-Bom dia. - respondi
Ele também respondeu, entre dois bocejos.
A enfermeira ajudou-me a me ajeitar na cama, posicionou a mesa e saiu. Foi então que Makoto se levantou e veio falar comigo.
-Dormir bem?
-Sim. O efeito da anestesia ajudou um pouco. E você?
-Mais ou menos. Aquele sofá não é muito confortável.
Tentei um sorriso, mas não estava com tanto ânimo para tal. Minha mãe veio a minha cabeça.
-O que foi?
-Só queria a minha mãe aqui. Queria conversar com ela.
-Eu posso trazê-la aqui para te ver.
-Não, Makoto, não precisa. Eu não quero incomodá-la.
Comi após isso. Passei o resto do dia em observação, apenas para certificarem que eu não voltaria a sangrar. Sai quase amanhecendo de novo. Viemos direto para casa e Makoto teve que pedir folga ao chefe de novo.
Ao chegarmos, só me veio uma vontade de ficar sozinha. Fui a caminho do meu quarto, Makoto me interrompeu:
-Onde vai, Kazuko?
-Pro meu quarto. Eu só quero ficar sozinha!
Ele não disse nada e também não era para isso mesmo.
Eu já chorei bastante e ainda preciso chorar. Não faço ideia de como tirar essa tristeza e culpa de mim. Achei que desabafar aqui fosse melhorar, mesmo que um pouco, mas não adiantou.
Só espero que o tempo consiga curar esta ferida.”
Era o fim da anotação.
Eu permiti uma lágrima solitária cair, apenas por conta das lembranças. Deixei o diário de lado e Kazuko me consolou.
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